ABRAÃO E A MAÇONARIA

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A Lenda do Ofício efetua uma rápida transição para a sua introdução no Egito. Fá-lo através da invocação de um personagem que a Bíblia efetivamente regista ter estado no Egito, Abraão, mas, como se verá, com a exteriorização de mais um evidente anacronismo. 
Recorde-se o texto desta passagem da Lenda do Ofício:
Mais tarde, quando Abraão e Sara, sua mulher, foram para o Egito, ali ele ensinou as sete ciências aos egípcios; e teve um valioso discípulo, chamado Euclides, que aprendeu bem e foi Mestre das sete ciências liberais.
A Bíblia refere Abraão, designadamente no Génesis, como pertencendo à nona geração de Sem, filho de Noé, e ser originário de Ur, cidade do Sul da Mesopotâmia. 
Relativamente à sua estada no Egito, a Bíblia refere que, tendo ocrrido uma seca e fome em Canaã, onde Abraão se havia estabelecido, este levantou o seu acampamento e rumou ao Egito. 
Aí, temendo ser morto, em virtude da grande beleza de sua esposa, Sara, combinou com esta que ela se dissesse sua irmã, e não sua cônjuge. 
O Faraó apaixonou-se pela beleza de Sara e levou-a para o seu palácio. Porém, Deus castigou o Faraó e este, bem mais prudente do que viria a ser o seu sucessor, no tempo de Moisés, mandou chamar Abraão e devolveu-lhe Sara, ordenando que ambos deixassem o país, com todos os seus bens.
Abraão não é referenciado na Bíblia pela sua sabedoria, antes pela sua piedade, crença, obediência a Deus. 
Exemplo maior disso é o episódio do Sacrifício de Abraão (melhor seria dizer sacrifício de Isaac…), ilustrado pela pintura que acompanha este texto.
Os autores da Lenda foram beber essa reputação de sapiência em Josephus e nas suas Antiguidades. Ali, Josephus escreveu que Abraão foi considerado pelos egípcios um homem muito sábio e que, para além de ter reformado os seus costumes, lhes ensinou aritmética e astronomia.
Esta passagem da Lenda é interessante precisamente por ilustrar diretamente duas das fontes de que os autores medievais da mesma se socorreram, em relação à Antiguidade: A Bíblia e as Antiguidades de Josephus. Outras fontes dos autores da Lenda, em relação à Antiguidade, terão sido também as Etimologias, de Santo Isidoro e o Polychonichon, de Ranulph Higden. 
Aliás, provavelmente, quer as Antiguidades , quer as Etimologias, terão sido conhecidas em segunda mão, através precisamente das transcrições delas feitas no Polychonichon.
A passagem hoje analisada contem um evidente anacronismo, a alegada contemporaneidade de Abraão e Euclides. Este, na realidade, viveu dois mil anos depois de Abraão!
O anacronismo só se resolve se considerarmos que a relação de Mestre-discípulo invocada pela Lenda não foi uma relação física e contemporânea, mas antes uma relação de influência. 
Isto é, Euclides, que não foi contemporâneo de Abraão, inspirou-se, recolheu, os ensinamentos deste e desenvolveu, a partir daí, os seus grandes conhecimentos na Ciência da Geometria.
Por este processo, a Lenda transfere, assim, a sua atenção da Caldeia para o Egito e, partindo do personagem bíblico de Abraão, associa-lhe o grande geômetra que foi Euclides e passa seguidamente a narrar a introdução lendária da Geometria, sinônimo de Maçonaria, no Egito.

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