A ampulheta
A ciência antropológica nos demonstra, hoje, por seis tipos de provas, que houve evolução; são as provas paleontológicas, as embriológicas, as dos órgãos residuais, as anatômicas, as sorológicas, e as geográficas.
Como se deu a evolução, ainda é uma incógnita.
E teorias várias 27 Extraído parcialmente do livro História da Filosofia de Will Durant, da pág. 31 a 32 22 têm surgido, sem que o fato tenha sido explicado cabalmente.
Nem Darwin, com sua luta pela vida, nem Lamarck, com sua transmissão dos caracteres adquiridos, nem Hugo de Vries, com o seu mutacionismo esclarecem como a evolução se deu.
Assim, refutar teorias da evolução, teorias evolucionistas, é fácil; o impossível é negar os fatos, documentos e provas que atulham os museus antropológicos.
Antes, se procurava o elo que faltava; hoje foram descobertas séries inteiras deles.
O Homo Habilis viveu há dois milhões de anos; sua pele era escura, depilada, e tinha l,30m. de estatura. Mas esse macacóide se distinguia já de todos os demais símios: falava, fabricava instrumentos e era antropófago.
Assim, desde que o primata superior se equilibrou nas patas traseiras, libertou as mãos para prender e segurar, coisa que antes era feita com os dentes, do modo como o fazem os animais nossos conhecidos.
A ociosidade dos maxilares produziu o seu atrofiamento e o esforço das mãos e da língua provocou o aumento da massa encefálica, e a conseqüente expansão da caixa craniana.
Com o surgir do pensamento, da razão, apareceu a necessidade da comunicação por meio da linguagem.
Então, a linguagem que era antes feita só de interjeições, começou a complicar-se.
Desde que o primitivo descobriu que tinha voz, nasceu o canto, e, com este, o ritmo, a dança.
Por meio da dança se representavam cenas de caça, ou era ela usada no culto dos deuses. Então, a dança e os gestos eram liturgia, e os petrechos empregados durante a liturgia eram símbolos.
Eis a origem remota dos símbolos e da liturgia.
A própria linguagem musical se grafa com símbolos, e a linguagem literária nasceu dos desenhos simplificados de animais e coisas.
O homem desenhava, e os desenhos foram-se, aos poucos, esquematizando nos símbolos gráficos que ainda hoje usamos. Todos os eventos históricos sempre foram relembrados num ritual, os das caçadas, os das guerras, os das lendas do aparecimento dos deuses.
Nós estamos rodeados de símbolos, e nos comunicamos por linguagem feita de símbolos.
Compelidos pela necessidade de se comunicar, os homens criaram várias formas de linguagem que são, para citar as mais importantes, a pictórica, a escultural, a musical, a literária e a simbólica.
Porque sempre se usou a liturgia e o simbolismo; porque desde sempre se empregou os ritos místicos, iniciáticos, nos vários mistérios, por isso supõem alguns que a origem da Maçonaria se perde na noite dos tempos.
Ela é, de fato, a revivescência dos métodos e processos iniciáticos que sempre existiram, e é neste ponto que se perdem em fantasias os maçons chamados místicos.
Todavia, os maçons autênticos sabem que a Sublime Instituição nasceu de corporações de pedreiros livres da Idade Média. Contudo, porque a Maçonaria é o repositório de todas as conquistas da humanidade, tanto intelectuais, como espirituais, como morais, para poder abarcar toda a vastidão do progresso, teve de sintetizar tudo na sua simbologia.
A linguagem simbólica, pois, é a da síntese.
E para que vós, Poderoso Irmão, possais saber quanta coisa se oculta sob um símbolo, eu vos hei de falar hoje sobre a ampulheta:
Quando o neófito começa sua iniciação maçônica, é levado à Câmara das Reflexões. Esta é um cômodo pintado de preto, lúgubre, macabro; lágrimas, pingando, aparecem desenhadas sobre as paredes; uma foice ou alfanje adverte:lembra-te que te hei de ceifar para que sejas pó; e uma caveira o alerta: és mortal; aplica-te a conquistar a virtude; há o dístico vigilância e perseverança de que hei falado no outro estudo; lá está o galo a anunciar: eu sou o que desperta o dia; cuida de ser perfeito.
Depois vem a ampulheta que nos sugere: o tempo passa com o passar da minha areia; sê perseverante em tua ação; acaso sabes quanto tempo tens para concluir tua tarefa?
Mas, que é a ampulheta?
É um relógio de areia que substituiu o mais antigo ainda de água e o de sol.
E que é um relógio? É um dispositivo que nos permite contar o tempo.
E que é o tempo?
Já dizia Santo Agostinho: "Se ninguém me pergunta o que é o tempo, eu sei o que é o tempo; mas se alguém me pergunta o que é o tempo, eu não sei o que é o tempo!"
Assim o tempo é uma das grandes dificuldades da filosofia.
Aqui divido meu estudo em tempo cronológico e tempo vital. Hoje vos falarei sobre o tempo vital; e se os Poderosos Irmãos o desejarem, falarei, da próxima vez, sobre o tempo cronológico.
O tempo vital é o da duração da nossa vida, a da vida da sociedade, o da civilização.
Esse tempo contamos como passado, presente e futuro. O homem vive a partir do futuro, vive em função do futuro, vive tendo em vista o futuro.
Todas as nossas ações, todos os nossos esforços são feitos para realizar uma programação que pertence ao futuro. Mas, como será o futuro? Será ele do modo como o desejarmos?
Não: porque ele depende do passado; a vontade quer, mas o passado resiste.
Por isso o futuro será uma resultante do passado mais a nossa ideação. O passado têmo-lo na história; e o futuro, na nossa programação. É ainda Santo Agostinho o que dizia: "Se queres conhecer o futuro, olhai o passado!".
Por isso o homem se assemelha ao deus jano de duas caras. Um rosto fita o futuro onde está o ideal a ser realizado; o outro encara o passado que já foi, no qual se gravaram as impulsões que determinam, em parte, o presente.
Foi Numa Pompílio, segundo rei de Roma, sucessor de Rômulo, o que, entre outras grandes coisas que fez, decretou o calendário de doze meses, que ainda hoje usamos.
O primeiro mês recebeu o nome de "januarius", donde o nosso janeiro, em homenagem ao deus Janus, deus da paz, e que por isto mesmo seu templo ficava fechado em tempo de guerra.
No começo do ano está "januarius" ou Jano, com suas duas faces, uma a olhar para o passado, a contar pelo ano que se findou, e a outra a encarar o futuro, no ano que se inicia.
O passado não desaparece, e antes pervive em cada minuto do presente. Um homem que sofre um acidente grave, fica com uma neurose do desastre!
Se o passado não persistisse, seria impossível educar-nos.
Um homem sem passado, é um indivíduo que perdeu a memória, ficou amnésico, e tem de reaprender tudo de novo como uma criança.
Vieira escreveu um sermão em que dizia que "tudo passa e nada passa; tudo passa para a vida, e nada passa para a conta".
Nenhum minuto se perde, porque se acha assegurado no minuto seguinte, na hora, no dia, no mês, no ano, na década, no século, no milênio, na eternidade.
Todo o minuto se eterniza como antecedente de que decorre o futuro. O passado se sedimenta, se cristaliza em nossa vida.
Nós somos filhos do tempo.
São Tomás de Aquino, em sua filosofia concreta, querendo saber em que consiste a eternidade, chegou à conclusão de que ela é o momento, ou a menor porção possível do tempo.
Hoje ele teria dito que a eternidade é o que a ciência chama de tempo mínimo, ou seja, o raio do elétron percorrido com a velocidade da luz.
O passado se eterniza, e nenhum minuto se perde. Assim, todo o momento é eterno como dizia São Tomás. O passado não morre nem desaparece, e antes, pervive no presente, e, até certo ponto, determina o futuro. Deste modo, porque cada segundo se eterniza, cada movimento passado se mostra atuante no presente, donde vem que "tudo passa e nada passa; tudo passa para a vida, e nada passa para a conta", conforme o disse Vieira.
Como numa máquina de calcular, cada momento é como cada pressão que fazemos na tecla de um número, e tudo vai sendo levado para o somador.
Não obstante, a outra cara do deus Jano fita o futuro do que queremos ser; e se planejarmos bem esse futuro, se formos persistentes, perseverantes na ação, ainda que o passado nos atrapalhe em parte, acabamos por vencer.
Tudo o que disse, e também o que não disse, está resumido num simples símbolo que é a ampulheta. Ninguém se iluda: cada símbolo, cada gesto litúrgico, representa a síntese de uma lição profunda.
Sobre cada um deles eu posso discorrer um pouco; porém, muito mais ainda é o que fica por dizer... No entanto, muitos há que entram para a Sublime Instituição, e acabam saindo dela, por julgar, ainda que o não declarem, que isto aqui é uma palhaçada.
Esses tais não podem ser maçons; precisam ser adormecidos.
Porém, aqui vão permanecendo selecionados, os que podem compreender: esses são os verdadeiros maçons.
fonte: Luiz Caramaschi Editora Sociedade Filosófica Luiz Caramaschi
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