Zumbi, considerado o grande herói de Palmares, tinha escravos.
Fatos como esse, que ainda passam em branco em muitas aulas de História, fazem parte do lado pouco explorado da escravidão no Brasil.
Em vez de meras vítimas, os negros tiveram papel mais complexo na sociedade colonial, às vezes até com status semelhante ao dos portugueses.
Narloch diz que o objetivo não é desmerecer os negros.
“Pelo contrário, acho que eles podem se orgulhar de que seus antepassados não eram pobres coitados, mas, em muitos casos, pessoas prósperas, que não abaixavam a cabeça”, diz em entrevista ao UOL Educação.
O autor lembra que, nos tempos do Brasil colonial, a escravidão era vista como algo natural. Portanto, era de se esperar que negros em ascensão na sociedade, como Zumbi, tivessem escravos também.
Outro erro comum, segundo Narloch, é considerar os africanos um grupo homogêneo.
Na verdade, eles vieram de regiões e grupos étnicos diferentes, cada qual com sua cultura e hábitos.
Veja alguns mitos sobre a escravidão no Brasil.
Mito 1
Palmares era um quilombo baseado em princípios democráticos e Zumbi, seu líder, era um mártir da resistência contra a escravidão.
Zumbi estava longe de ser um herói da democracia. “Mandava capturar escravos de fazendas vizinhas para que eles trabalhassem forçados no Quilombo dos Palmares. Também sequestrava mulheres, raras nas primeiras décadas do Brasil, e executava aqueles que quisessem fugir do quilombo”.
A vocação para o poder de Zumbi vinha de família. Ele descendia dos imbangalas, considerados os “senhores da guerra” na África Centro-Ocidental. Ou seja, nada mais natural que se considerasse no direito de ter seus próprios servos.
Mito 2
Todos os negros eram subjugados pelos portugueses.
Quando chegavam ao Brasil na condição de monarcas, os negros não sofriam os mesmos maus-tratos dos escravos. Alguns vinham até para estudar, como é o caso dos filhos do rei Kosoko, de Lagos, hoje capital da Nigéria. O pai enviou os filhos ao Brasil “provavelmente de carona num navio negreiro cheio de escravos vendidos por ele”.
Mito 3
Não havia mobilidade social entre os negros escravos.
Sobretudo em áreas mais prósperas, os negros tinham possibilidade de ascender na sociedade. Após conquistar a alforria, eles poderiam adquirir bens e, inclusive, outros escravos. Essa é uma diferença importante entre o Brasil e os Estados Unidos, onde os negros não tinham direito a agregar posses.
Algumas escravas chegaram a atingir certo status. “Contando com escravos como mão de obra barata, algumas fizeram fortuna. A angolana Isabel Pinheira morreu em 1741 deixando sete escravos no testamento”.
Mas Narloch adverte: “apesar disso, essas mulheres nunca se livraram do estigma de negras, que sempre as marcaria na sociedade independentemente das posses”.
Mito 4
A Inglaterra tinha só interesses comerciais no fim da escravidão.
Os abolicionistas ingleses tinham motivações mais ideológicas que econômicas. Um grupo de 22 religiosos ingleses se reuniram em 1787 para brigar pelo fim da escravidão e, segundo Narloch, constituem um dos “primeiros movimentos populares bem-sucedidos da história moderna, um molde para as lutas sociais do século 19”. E, em vez de prosperar economicamente, a Inglaterra teria perdido lucros com o fim do tráfico negreiro.
“Muitas das cidades mais ativas na abolição, como Manchester e Liverpool, eram as que mais lucravam vendendo para reinos escravistas da África e da América”.
O Quilombo dos Palmares foi um dos muitos refúgios de escravos existentes no Brasil, sendo conhecido por ter abrigado a maior liderança de negros e índios libertos do país e tornado-se o maior quilombo da nação, refugiando mais de 20 mil quilombolas.
ResponderExcluirMas, por que o Quilombo dos Palmares é tão grande? Bom, é que entre as décadas de 1630 e 1650, os donos dos engenhos de açúcar no norte do Brasil diminuíram a segurança dos terrenos, pois precisavam lutar contra a invasão holandesa (saiba o porquê da invasão no texto sobre o Brasil holandês). Para os negros escravizados, esta foi a oportunidade perfeita para fugir e tentar viver em liberdade, sendo que, para não serem pegos, uniam-se em comunidades chamadas quilombos – o dos Palmares era o mais acessível para quem fugia das fazendas do nordeste.
Com tanta gente reunida no mesmo local, já era de se esperar que o Quilombo dos Palmares criasse uma liderança – e foi justamente isso o que aconteceu.
Essa comunidade de negros e índios refugiados começou a planejar formas de dar um fim na escravidão, começando com o resgate de familiares e companheiros que ainda trabalhavam como escravos nas fazendas.
Não demorou para que o quilombo chamasse a atenção dos escravocratas, afinal, os escravos representavam a maior parte da mão de obra das fazendas e, sem eles, os donos das terras teriam grandes prejuízos comerciais.
ResponderExcluirDessa forma, os donos de engenho organizaram-se em expedições para derrotar a comunidade e retomar a propriedade dos negros e índios refugiados.
É aqui que vem o plot twist dessa trama. Ao contrário do óbvio, os índios e negros venceram mais de trinta tentativas de invasão, somente utilizando a força popular e pouquíssimas armas, permanecendo invictos por oitenta anos.
Definitivamente, esta foi uma prova de que o poder de uma ideia pode ser mais forte do que o poder de uma bala. No entanto, como toda história tem sempre um “mas”, o Quilombo dos Palmares não acabou com um final feliz.
Zumbi dos palmares e o fim do quilombo
ResponderExcluirzumbi dos palmaresOs quilombos tinham líderes que serviam para gerenciar as terras e a comunidade como um todo. Até a década de 1670, quem liderou a comunidade dos Palmares foi Ganza Zumba, o qual tinha forte carisma. No entanto, a sua imagem ficou manchada ao fazer um acordo com o governador de Pernambuco, Aires Souza Castro, em 1978, decretando a liberdade de todos os quilombolas nascidos em Palmares, bem como o pertencimento legal das terras onde moravam, na região norte do Alagoas.
Apesar de parecer um acordo favorável, a negociação não agradou a todos. Muitos palmarinos não aceitaram a ideia de negociar com os mesmos homens que os escravizaram. Então, os discordantes aliaram-se e nomearam Zumbi dos Palmares como o novo líder, tornando a comunidade dividida.
O que nenhum dos lados sabia é que a coroa portuguesa já estava se organizando para invadir o quilombo, só não tinha intervindo ainda porque procurava pela pessoa certa para derrotar a comunidade quilombola. Em 1964, surgiu o nome perfeito para esta função assassina: o bandeirante Domingos Jorge Velho, um guerreiro experiente na escravização de indígenas, que conhecia muito bem a região de Pernambuco. Já falamos, aqui, sobre quem foram os bandeirantes.
Logo na primeira invasão, o Quilombo dos Palmares foi quase completamente destruído. Impedido de continuar a luta, Zumbi deixou o território junto de poucos sobreviventes, na esperança de tentar reconstruir a comunidade quilombola em outra região mais afastada – o que não foi muito longe. No ano seguinte, no dia 20 de novembro, o líder foi surpreendido por Domingos em uma emboscada e acabou sendo degolado e exposto em praça pública, em Recife, para servir de exemplo a outros negros e índios que pudessem querer se revoltar contra a escravidão.
O dia da morte de Zumbi é lembrado todos os anos até hoje como o dia da consciência negra, comemorado pelos movimentos de resistência que sofrem até hoje com o racismo herdado do regime escravagista brasileiro. Saiba mais sobre quem foi este líder quilombola no texto completo sobre Zumbi dos Palmares.