“Usos e costumes” é uma expressão muito utilizada no meio maçônico para descrever – erroneamente – os elementos da tradição.
Em geral, ela descreve um conjunto de práticas utilizadas através dos tempos, mas que têm significado desconhecido ou mesmo desprovidas de significado.
Tais práticas ou são deformações de algo que no formato original possuía significado, ou são absolutos erros incorporados através de sua constante prática.
Então, com o passar dos anos, perpetuam-se os erros, e lá está a idéia mal-formada dos “usos e costumes”, pronta para protegê-los do poder retificador da regeneração.
Tal deformidade “fobisófica” (fobus = inimiga, sophia = sabedoria) serve ao propósito de justificar algo, cuja justificativa se desconhece, exercendo o papel de um grande “guarda-chuva” que torna indissolúvel aquilo que permanece sem causa.
Na Maçonaria, tudo deve ser tratado aos influxos da moral e da razão, sendo que, portanto, ela não pode comportar nada de imoral e nem de irracional.
O que não estiver revestido do vigor moral e da clareza da razão deveria ser extirpado de nossos Templos, sob pena de incorrermos no erro e, por conseqüência, no vício.
Lembremos que a antigüidade de uma prática não outorga legitimidade a ela, e sim a proximidade de sua essência com as leis do universo; da mesma forma que a sabedoria de um maçom não é certificada pelo o colorido de seu avental, mas sim por sua humilde predisposição para aprender e evoluir, valorizando a alvura do avental dos eternos aprendizes que devemos ser.
A Tradição Maçônica não é composta de intocáveis “usos e costumes”, mas de um profundo conteúdo moral e filosófico, cujos princípios devem permanecer intactos, mesmo que estejam apresentados sob as mais diversas roupagens.
Tais roupagens devem sofrer constantes renovações, de forma a preservar, não a velha e puída roupagem dos “usos e costumes”, mas os intocáveis e indestrutíveis princípios que concedem à Maçonaria o título de “arte-real”, sob os auspícios da pura moral e da límpida razão; idéia contrária não permitiria adaptá-la ao contexto da atualidade, esta que aspira ser presenteada pela prática dos princípios, mas a cobre com o espesso véu da ignorância.
O maçom, como “amigo da sabedoria” – leia-se, filósofo – que deve ser, precisa buscar compreender a razão de ser das coisas.
A tolerância não o obriga a aceitar aquilo que se apresenta sem propósito; apenas adia brevemente seu entendimento, levando a uma busca correspondente que traga luz ao que é potencialmente aceitável.
Por isso, não traz consigo a Maçonaria qualquer dogma inquestionável, mas sim um profundo conhecimento que deve ser desvelado pelo “amigo da sabedoria”.
O silêncio e o mistério devem ser instrumentos práticos da tolerância à serviço da preservação da verdade e não a sepultura do conhecimento.
A morte iniciática que não precede um renascimento é tão útil quanto o livro que não é lido, assim como o vulgo significado de “sacrifício” nada tem de semelhante com o ofício sagrado – ou “sacro ofício”.
A renovação da roupagem com que são apresentados os princípios é o igualmente ouvido e desprezado “aperfeiçoamento dos costumes”, aos quais os rituais maçônicos fazem referência.
Aperfeiçoá-los significa mantê-los em movimento, descristalizar os comportamentos, tal como os elétrons que orbitam para criar a matéria, tal como a vontade ativa que transforma o ignorante em sábio, tal como o preconceito que transmutado dá lugar ao conceito, o erro que dá lugar à verdade e o vício que dá lugar à virtude.
“Levantar templos à virtude e cavar masmorras ao vício” significa dissolver os automatismos inconscientes que nos mantêm presos à ilusão da matéria, de forma a criar hábitos conscientes, concebidos pela pura sabedoria, impulsionados pela força da vontade e iluminados pela beleza da razão.
Publicado na Revista “A Trolha”
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