A MAÇONARIA É INSUBSTITUIVEL?

A Ordem Maçónica continua envolta na névoa do mistério e na verrina da maledicência. 

Há no inconsciente coletivo um lastro de veniaga deixado pelos verdugos da Inquisição e dos regimes totalitários que, de quando em vez, ainda aflora no espírito dos incautos. 

E, contudo, a Maçonaria é a mais antiga organização que traz insculpida no cerne dos seus propósitos, como num código genético, o conhece‑te a ti mesmo como forma de penetrar no «sentido íntimo do universo», no dizer de Fernando Pessoa, e os nobres ideais da Liberdade, Igualdade e Fraternidade, sem os quais não será possível construir uma sociedade mais justa, que é a profunda motivação dos homens bons de todos os tempos. 

A Maçonaria é uma Ordem universal, progressista, filosófica e filantrópica. 

Está aberta a todas as pessoas, de quaisquer credos, ideologias, raças e misteres, que se identifiquem com os seus objetivos. 

Foram e são seus membros, reis e presidentes da República, intelectuais, artistas e operários, aristocratas, cientistas e plebeus, militares e ministros do culto. 

A Maçonaria sempre esteve na vanguarda dos movimentos de libertação do homem, inspirando as mais belas páginas da História: as proclamações dos Direitos Humanos e da criança, a abolição da escravatura e da pena de morte, a luta anticolonialista, o sufragismo universal, a igualdade de raças e de sexos. 

Esteve sempre representada nos mais altos cargos do Estado e da administração. 

Promoveu as leis do divórcio, do registo civil e da instrução primária obrigatória. 

Ajudou a redigir as Constituições liberais e republicanas. Inspirou a criação de centenas de instituições culturais, científicas e de solidariedade.  

Os comunistas acusaram‑na de reacionária e aliada dos grandes interesses financeiros. 

Os fascistas apodaram‑na de plutocrática e ligada ao comunismo e judaísmo internacionais. 

A Igreja crismou‑a de «herética pravidade», ao serviço do demónio... 

No entanto, a Maçonaria é apenas uma associação fraternal de pessoas livres e honradas ou, no dizer do rei Frederico II da Prússia (Séc. XVIII), de «homens tranquilos, virtuosos e respeitáveis», que procuram a verdade, lutam pela justiça e querem tornar‑se melhores para, assim, participarem na edificação de uma sociedade mais justa. Não discute política nem religião, pratica o livre‑pensamento e a tolerância. 

Sendo, pois, uma organização comprometida com o mundo, na medida em que pretende moldá‑lo pelos seus ideais, poderá objetar‑se que não se justifica a sua existência nas sociedades democráticas modernas. 

Não são os partidos o instrumento privilegiado para realizar as transformações político‑sociais que os maçons tanto almejam? 

Diremos, porém, desde já, que o objetivo essencial da Maçonaria é o aperfeiçoamento moral e espiritual dos seus membros e a defesa da moral universal. 

Esta função escapa aos partidos e a outras organizações, e é assaz relevante numa sociedade cada vez mais desumanizada e mercenária, que perdeu quase todas as referências ético‑culturais e erigiu o dinheiro como valor supremo. 

Por outro lado, os partidos são, em geral, simples má‑ quinas de conquista do poder; praticamente despojados dos seus princípios programáticos por um carreirismo desenfreado e tentacular, que ameaça subverter o ideal democrático, ele próprio uma conquista da Maçonaria.  

Pertencendo ou simpatizando os maçons com as várias correntes partidárias, poderão aí, mais frutuosa e consistentemente, pugnar pela efetivação das reformas necessárias à construção da nova sociedade. 

De fato, a Maçonaria não intervem, e não deve intervir, como tal, na vida política

A sua influência manifesta‑se apenas indiretamente, através da ação individual e do exemplo dos seus filiados. 

E sendo a Ordem Maçônica um espaço de diálogo fraterno entre pessoas de todas as ideologias democráticas, pode e deve continuar a desempenhar, por esta via, um papel importante no aperfeiçoamento das instituições, insuflando‑lhe os valores morais que são o ágio e timbre de um verdadeiro maçon. 

Os partidos, essenciais ao regime democrático, não substituem a Maçonaria como forma de intervenção ético‑social. 

Os seus fins e modos de atuação são completamente distintos. 

A Maçonaria quer despertar no Homem o sentido do eterno. 

Os partidos procuram no eleitor a adesão ao efémero. 

A Maçonaria não é um partido ou uma igreja, cuja influência se conta pelo número de prosélitos. 

A Maçonaria é apenas uma Fraternidade que se julga depositária de valores ancestrais e que procura dar resposta às profundas inquietações que, desde os arcanos da História, palpitam no coração do homem. 

Por isso é insubstituível e necessária. Por isso é universal e eterna. 


Obra da Universidade de Coimbra 

Autor: António Arnaut

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