A filosofia nos graus simbólicos
A Maçonaria, como Instituição filosófica e iniciática, procura despertar no homem o senso de justiça e a perfeição. Para tanto, faz-se necessário, inicialmente, que ele mergulhe nos seus pensamentos, buscando a fonte da razão da sua existência.
Só assim será capaz de decifrar os enigmas interiores, quebrando as arestas que o separam da “verdadeira luz”, polindo a sua alma e tornando-se um homem capaz de trabalhar a Pedra Bruta que o simboliza nos seus estágios evolutivos na investigação, interpretação e compreensão do seu próprio “EU”.
Neste sentido, interpreta-se ao iniciado o mundo maçónico, no qual a Loja é o símbolo do macrocosmo, o Universo; e do microcosmo, o homem.
É missão do Aprendiz trabalhar a sua interioridade no controle de “si”, buscando compreensão através dos ensinamentos a ele transferidos: os significados do desbastar a Pedra Bruta.
Vencer as paixões mundanas deve ser a sua primeira reflexão; num estágio seguinte, ele trabalha desbastando as asperezas que o deixam cego, enquanto profano, impedindo-o de enxergar o “diamante” que é o homem.
Agora, o Aprendiz, enquanto ( neófito, é instruído a trabalhar no sentido de quebrar as arestas que encobrem todo o brilho da essência humana, para, então, quando Companheiro, trabalhar na Pedra Cúbica.
É no mestrado que esse conhecimento filosófico adquire corpo sólido.
Assim sendo, é de fundamental importância que o Maçom deva instruir-se a respeito dessa parte filosófica, porque a vida em si é o exercício da filosofia.
Para adquirir estes conhecimentos, o Aprendiz tem que evoluir simbolicamente e subir com dificuldade os degraus da escada de Jacó.
A cada conhecimento adquirido, ele faz uma reflexão da sua existência; a percepção é individual e intransferível, levando-o com os seus estudos e observações a uma interpretação pessoal da vida na compreensão do amor ao próximo, alicerce de toda felicidade humana.
A investigação da verdade é a base da Filosofia Maçónica.
A compreensão da Arte Real deve ser interpretada, na Maçonaria Especulativa, como sendo o aperfeiçoamento na arte de pensar, da investigação em busca do significado da existência e da verdade.
Jules Michelet, historiador e escritor francês, afirma: “É preciso planar sobre o que nós fazemos. É necessário saber muito mais por cima e por baixo, ao lado e de todos os lados, rodear o seu objecto e tornar-se o seu dono”.
Grau de Aprendiz Maçom
O grande filósofo Sócrates ensina ao Aprendiz em filosofia, que a primeira coisa a fazer é aprender a pensar. Ele afirma: “Conhece-te a ti mesmo”. Aprendendo a pensar, aprende-se a conhecer, a discernir, a falar. Foi o que o próprio Sócrates fez.
Desta forma a linguagem que ele usa é sempre a linguagem do conhecimento.
Eis aí o primeiro passo do Aprendiz Maçom:
Aprender a pensar. Como a Filosofia está embasada na busca e na investigação para chegar ao conhecimento, por analogia, o Aprendiz Maçom, mergulhado no seu interior, no seu pensar, procura entender o sentido do seu próprio “EU”, passando a conhecer-se melhor. Desta forma, morre para o mundo profano, renascendo com outra visão de mundo, buscando outro estilo de vida completamente transformador.
Sócrates afirma também que o homem deve morrer instintivamente, para que as virtudes do seu interior possam aflorar, elevando-o acima das pequenas coisas desse mundo.
Sócrates ainda nos fala: “O existir nada mais é que o quotidiano na busca do saber”. Para ele, a virtude só será alcançada quando se adquire a ciência, mas para isso depende do trabalho e da luta constante que o homem pode empregar na busca do conhecimento.
Filosoficamente, sabe-se que a existência humana passa pela questão do “SER”.
O Aprendiz Maçom deve ter como objectivo conhecer primeiro a “si” mesmo, desbastando a Pedra Bruta, para daí, então, compreender todo o sentido da lapidação do espírito; não se limitar ao pensamento primário de que o ser está singularizado no “SER É, O NÃO-SER NÃO É”.
Cabe aqui descrever o que Tomás de Aquino, preceitua: “O ser não se pode acrescentar nada que lhe seja estranho, porque nada lhe é estranho, com excepção do NÃO-SER, que não pode ser nem forma nem matéria”.
Conhecer, portanto, é descobrir o “SER”; assim, para o Aprendiz Maçom, o conhecimento pode significar o nascimento do seu “SER” interior.
Compreendendo a “si” mesmo, ele diferencia-se do profano, pois uma nova luz ilumina o seu caminho, uma vez que visualiza as coisas com o olho do pensamento, usando a lente da inteligência, ao passo que o profano olha e não vê. É aí onde reside a diferença entre o olhar e o ver, entre o profano e o Aprendiz Maçom.
Com base no pitagorismo, o Aprendiz mergulha no silêncio, como primeiro fim, para que se possa melhor enxergar, ouvir e meditar.
“Conhece-te a ti mesmo!”
Esta assertiva no sentido maçónico leva à conclusão de que, se o Aprendiz Maçom não praticar o conhecimento interior, se não lapidar o seu espírito com a finalidade de evoluir, com a intenção de aperfeiçoar o seu intelecto, não buscar uma conduta condizente com os princípios da moral e da razão, não conseguirá desbastar a Pedra Bruta.
Portanto, o Primeiro Grau ensina que é necessário o conhecimento próprio, para daí se partir para outros conhecimentos. Finalmente, o Aprendiz deve aprender a trabalhar em equipa, com amor, vigilância e dedicação.
Grau de Companheiro Maçom
Uma vez o Aprendiz Maçom conhecendo o seu interior, ele agora está preparado para o passo seguinte, alicerçado no pensamento do filósofo francês René Descartes: “Se duvido, penso, se penso, existo”. É a senda do Companheiro Maçom.
Por estar filosoficamente bem mais elevado, o Grau de Companheiro Maçom, direcciona-o para a verdade científica, anulando definitivamente as superstições. Neste grau, pode-se fazer uma síntese das filosofias de Pitágoras, de Parménides, de Sócrates, além de outros.
“O que somos? O que é que existe? De onde vieram as coisas? Para onde iremos?”
Estes questionamentos são, na verdade, a primeira grande influência filosófica do Segundo Grau, advindos dos primeiros pensadores pré-socráticos. Eles procuravam compreender e buscar soluções para os princípios das coisas existentes.
O ato de pensar era o caminho para chegar a conclusões concretas, visando encontrar uma resposta que se baseasse num ponto de vista lógico para os seus questionamentos.
A constante mudança que sucedia na natureza deixava o homem deslumbrado, diante do fenómeno que consistia em as coisas mudarem, desaparecerem e a natureza continuar a mesma.
Simbolicamente é o que acontece com o Companheiro: a sua primeira tarefa é fazer uma análise objectiva da realidade física, a fim de que ( possa chegar a um conhecimento tanto maior da existência.
A vida é um enigma e, no Segundo Grau, o tema é abordado filosoficamente: O que sou eu? O que é a vida? Que estou fazendo neste mundo?
Neste ponto, faz-se presente a filosofia de Paríriênides de Eleia, talvez o maior entre os pré- socráticos. Num dos fragmentos, dentre os que chegaram até hoje, ele filosofa: “Mas há no mundo o que importa mais que o mundo: O ser do mundo”.
Pitágoras dizia que o homem é a medida de todas as coisas. Portanto, quando se pensa, esse acto está sempre ligado ao “ser” e acredita-se que se não existisse elo, não existiria o pensar, haveria apenas um simples reflectir. Entende-se, assim, que o pensar tem sempre o homem como alvo principal.
Sendo um grande conhecedor do seu “EU”, o Companheiro Maçom, agora, passa a estudar o conhecimento sociológico para melhor entender e ter uma visão mais apurada dos valores sociais e individuais.
Ele passa a ser o defensor da vida social e inimigo das tiranias que procuram escravizar e alienar a inteligência e o espírito do homem, pois a Arte Real não admite entraves ao pensamento humano.
Com o exposto, entende-se que o Segundo Grau é essencialmente social. O Companheiro Maçom tem que trabalhar com afinco na prática da filantropia, a serviço da comunidade; ele tem que se despojar em beneficio dos seus semelhantes.
Eticamente o Companheiro Maçom deve possuir quatro atributos: ser um sábio, por compreender os significados da ciência, interpretar a Arte Real e, acima de tudo, por conhecer a “si” mesmo; ser forte por vencer as paixões alienadoras que escravizam o homem; ser um moderador nas diferenças e nas indiferenças da vida social; ter senso de justiça por ser um homem virtuoso, recto e íntegro. Atingindo estes objectivos, ele agora está preparado para subir mais um degrau da escada de Jacob.
Grau de Mestre Maçom
O filósofo Arcângelo Buzzi afirma que: “O estudo da filosofia desenvolve o espírito de fineza. Exercita o pensamento a conhecer a realidade por si próprio, tornando-se ele mesmo esclarecido, portador de luz força de discernimento”.
Por excelência o Mestre Maçom é um filósofo. Chegando ao Terceiro Grau, ele é muito mais Aprendiz do que quando tinha assento no setentrião, e muito mais Companheiro do que quando ocupava um lugar na coluna do sul. Diante desta afirmação, vem a pergunta que deve incomodar: Porque é que o Mestre é muito mais Aprendiz e muito mais Companheiro?
A resposta que deve ser levada em consideração é que a missão do Mestre Maçom é ensinar. A melhor forma de aprender é ensinando, e aprende-se muito mais do que estudando. Heidegger diz-nos: “É bem sabido que ensinar é ainda mais difícil que aprender”.
Para ensinar, o Mestre deve ser possuidor de conhecimentos, mas para isso precisa de estar aberto à aprendizagem como um eterno Aprendiz. Se for soberbo, ele acaba fechando-se e não evolui na arte de filosofar, daí os seus ensinamentos tornam-se falhos. Porém se ele exercitar a humildade e se deixar aprender, os seus conhecimentos renovam-se e todos se beneficiam; com essa conduta, há um mútuo enriquecimento entre ele, o Aprendiz e o Companheiro.
Neste contexto, ele deve aprender a deixar-se aprender. A sua compreensão ultrapassa os discípulos que se limitam a absorver o conhecimento transmitido, porque ele é uma fonte inesgotável de estudo e de pesquisa.
Se assim não o faz, só lhe resta inventar e propagar a filosofia do achismo, na qual ele supõe, mas não tem certeza de nada, tudo é fruto da sua imaginação.
A Maçonaria não admite invencionices, mas nela existem mestres que, agem dessa forma e, ocasionalmente, falam por pura intuição, sem fundamento no que diz; pura fábula criada pelo seu pensamento.
A constante pesquisa aliada à perseverança incentiva o Mestre a alcançar os objectivos desejados. É através da interpretação e compreensão do objecto em estudo que o questionamento é elucidado. É na tolerância que ele exercita a arte de aprender com paciência, como um Aprendiz ao desbastar a Pedra Bruta.
Sem a socialização do conhecimento, o Mestre só enxerga a “si” e assume uma conduta isolada, daí o que é filosófico entre os Maçons fica restrito a poucos pensadores.
Adotando esta postura, toda a sua filosofia adquire outro significado com deduções ilógicas sobre tudo com que se depara e passa a transmitir as suas conclusões aos Aprendizes Maçons como verdade absoluta. Desta forma, ele não está contribuindo com a Instituição na arte de filosofar.
O Mestre Maçom deve sempre pesquisar, sem se deixar influenciar pelo seu ímpeto, sem nenhuma base de sustentação nas ideias do achismo, sistemas ou doutrinas alienadoras.
É bom não confundir postulados maçónicos com dogmas, como se a maçonaria fosse uma seita. Ela não é religião, mas religiosa.
Sócrates, o maior de todos os filósofos gregos, disse:
Empenho muito mais belo é quando alguém, servindo-se da dialéctica, tomando uma alma apropriada, pela planta e nela semeia, com ciência, discursos que são capazes de ajudar aos próprios e a quem os plantou, e que não são infrutíferos, mas têm em si germes donde brotarão outros discursos plantados, noutras pessoas, discursos capazes de produzir estes efeitos, sem nunca falhar e de tornar feliz quem possui tal dom, tanto quando ao homem isso é possível.
O Mestre Maçom não se deve prender a ensinar a ritualística referente à Loja a qual pertence.
Ele transcende essa prática, esse pensamento, esses ensinamentos. Ele não pode ficar limitado à discussão dos trabalhos em Loja, muito menos falando em vão, externando maledicência, criando um clima de animosidade entre os irmãos, dando mau exemplo aos Aprendizes e Companheiros. Deve-se entender que ele é uma fonte de tolerância, de riqueza para a aprendizagem; é exemplo a ser seguido dentro e fora de Loja, pois é um Mestre Maçom.
Conclusão
O Mestre Maçom caracteriza-se pela serenidade ao pensar, pela sua humildade ao ouvir, pelo controle de “si” ao agir. Ele é o termómetro entre as colunas, é a harmonia na câmara do meio pela meditação na compreensão do significado da morte.
A ordem dos trabalhos requer tolerância e mansidão no uso da palavra, que circula tanto no ocidente como no oriente. Passa pela interpretação do significado da “luz” que emana do oriente, iluminando a todos num clima de união.
O Mestre Maçom deve ser possuidor da sabedoria que foi outorgada pelo G:.A:.D:.U:. ao Rei Salomão, quando ele se torna um Venerável Mestre ou um Sereníssimo Grão Mestre.
É neste exercício prático que o filosófico se torna concreto no mundo profano, onde o Maçom é o exemplo de homem digno da serenidade que lhe é peculiar.
Compreende-se que o Mestre Maçom é uma fonte inesgotável do pensar, do agir interagindo, do lapidar-se lapidando.
É a busca do saber até a luz do conhecer, é a compreensão dos significados que a vida lhe impõe, questionando os porquês, procurando soluções para as coisas imperceptíveis aos olhos do mundo profano, a fim de tornar-se um profundo conhecedor na arte de FILOSOFAR.
A Maçonaria como Instituição Filosófica precisa de homens pensadores, filósofos da vida, das experiências adquiridas dentro e fora das Lojas Maçónicas.
Nela não há discórdia de pensamentos, pois todos buscam esclarecer o que está obscuro, o inexplicável. A razão da sua existência está na vontade de interpretar e compreender os obstáculos que afastam o homem da paz interior, que o impossibilitam construir a felicidade humana.
Para ser Maçom não é preciso cursar Universidade, nem ter título universitário, muito menos ser Doutor, principalmente em Filosofia.
Nela, compreende-se que todo Maçom deve ser “livre e de bons costumes”; um pensador, um investigador que caminha nas veredas das observações das atitudes humanas, desprezando o que é desprezível, lapidando-se até o brilho do conhecimento.
Ser um incansável explorador em busca da Palavra Perdida e Indecifrável, trilhando o caminho da investigação, na compreensão da verdade até alcançar a luz que o libertará das trevas que o acorrentam até a morte, ressurgindo para uma nova vida.
Nesta compreensão, todo homem com estes pré-requisitos têm condições de adentrar pelo Portal que separa a ignorância da verdade e participar da meditação; filosofar sobre a vida, com a finalidade de encontrar o diamante que brilha no seu interior.
É um traspassar pela grade da razão, subindo pela escada de Jacó até alcançar, simbolicamente, toda sabedoria do Rei Salomão.
Como apêndice, o autor deixa um poema da sua autoria, em homenagem à Maçonaria, intitulado: Misteriosa Mulher.
Apêndice
MISTERIOSA MULHER
Alveriano de Santana Dias
Bibliografia
- GUERRA, Pe. Aloísio. Religiosidade e Maçonaria. Editora Maçónica a Trolha, Londrina, Novembro 2006.
- GRANDE LOJA MAÇÓNICA DO ESTADO DA PARAÍBA. Rituais dos Graus de Aprendiz, Companheiro e Mestre Maçom. G:.L:.O:.M:.E:.PB., João Pessoa, 1985, Nova Edição – 2005.
- GRANDE LOJA MAÇÓNICA DO ESTADO DA PARAIBA. Vademecum Maçónico. G:.L:.O:.M:.E:.PB. Editora Universitária, João Pessoa, 1991.
Material capturado na internet
- ALBUQUERQUE, Raimundo Rodrigues de. A Incidência Filosófica nos Graus Simbólicos.
- BATTAL, Moises Mussa. Filosofia da Maçonaria – “Lições de Filosofia Geral e Maçónica”. Editora Gazeta Maçónica. São Paulo. 1991.
- MORENTE, M. Garcia. Filosofia.
- NOVO DICIONÁRIO ELECTRÓNICO AURÉLIO.
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