Sob os cofres pintados de constelações, onde o avental branco contrasta com a escuridão do desconhecido, a Maçonaria desdobra não apenas um sistema de símbolos, mas um código moral tão rigoroso quanto flexível.
Sua ética não é uma simples listagem de proibições, mas uma arte de viver que entrelaça três princípios fundamentais: Liberdade, Igualdade, Fraternidade.
Estes conceitos, hoje repetidos até à saciedade em discursos políticos, encontram na logia uma profundidade singular.
Não são slogans, mas ferramentas de transformação pessoal.
Quando Voltaire defendia a liberdade de pensamento contra o fanatismo religioso, ou quando Rousseau proclamava que "o homem nasce livre, mas em todo lugar está acorrentado", estavam expressando ideias que ressoariam nas logias maçônicas do século XVIII.
Mas a Maçonaria vai além: sua liberdade não é licença para o caos, mas autogoverno pela razão.
O maçom é livre porque escolhe submeter-se a uma disciplina a da sua própria consciência, assim como o compasso só traça círculos perfeitos quando gira em torno de um centro fixo.
A igualdade maçônica, por sua vez, é um desafio permanente.
Na coluna do norte, onde os aprendizes escutam silenciosamente, e na do sul, onde os mestres compartilham a sua sabedoria, todos vestem o mesmo avental sobre trajes desiguais.
Esta igualdade ritual não ignora as diferenças humanas, mas transcende-as: recorda o "véu da ignorância" de John Rawls, onde a justiça só pode ser projetada a partir de uma posição de equidade original. Mas a Maçonaria acrescenta um elemento único: essa igualdade vive-se em carne própria, não em teoria, sempre que irmãos de diferentes classes sociais quebram o pão ritual.
E então vem a fraternidade, talvez o princípio mais revolucionário.
Não é um sentimentalismo, mas um pacto ético: o reconhecimento de que o outro, embora pense diferente, é tão buscador de luz quanto você mesmo.
Aqui surge o diálogo com Diderot, que em "O Sobrinho de Rameau" mostra que a verdadeira ilustração não está em saber muito, mas em saber conviver.
A cadeia de união não é apenas um gesto ritual; é a materialização de uma ideia filosófica: que os seres humanos são elos de algo maior.
O Homem Justo e Perfeito:
Entre Aristóteles e Nietzsche
No leste de cada loja brilha a estrela flamigeira, símbolo do ideal humano que todo maçom persegue.
Os antigos chamavam a este objetivo de "Homem Justo e Perfeito", um conceito que ecoa o brinco grego: a excelência moral como cimeira da existência.
Para Aristóteles, a virtude era um hábito cultivado com paciência, assim como o aprendiz pole sua pedra bruta dia após dia.
Mas a perfeição maçônica não é impecabilidade, mas sim harmonia entre pensamento, palavra e obra uma trindade que lembra o "super-homem" de Nietzsche, não como dominador de outros, mas como criador de seus próprios valores.
Este ideal ético encarna-se em
três desafios concretos:
• Domine as paixões (o baralho que esculpe a pedra bruta).
• Agir com justiça (a balança junto à espada flamigera).
• Servir sem esperar recompensa (o pelicano que alimenta com seu próprio sangue).
Curiosamente, enquanto Kant baseava a moral no dever puro, a Maçonaria como Schopenhauer insiste que a verdadeira ética nasce da compaixão ativa.
O avental, que protege das asperezas do trabalho, é também um lembrete de que o primeiro dever é construir-se para melhor servir.
No final, a ética maçônica não se aprende em livros, mas se vive na oficina do mundo real.
Como escreveu Goethe
(maçom e alquimista espiritual):
"Não basta saber, é preciso aplicar; não basta querer, é preciso fazer".
Entre o ideal e a ação, entre o indivíduo e a comunidade, a Maçonaria tece assim uma ponte única:
A moral como arquitetura da alma.
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