O Grande Arquiteto do Universo (G.A.DU.). Este termo, longe de ser uma invenção maçônica, é fruto de milênios de reflexão filosófica, teológica e científica.
Sua adoção pela maçonaria não foi casual, mas um ato deliberado de sabedoria, destinado a transcender divisões e unir os homens sob um princípio superior.
Seguiremos o rastro do G.A.DU desde suas primeiras menções na antiguidade até sua consagração nos rituais maçônicos, demonstrando como este símbolo serviu de ponte entre religiões, culturas e épocas.
As Origens Antigas:
Do Demiurgo ao Arquiteto Cósmico.
Platão e Demiurgo (Século IV a.C.)
A primeira grande referência a um "Deus construtor" aparece no Timeu de Platão. Neste diálogo, o filósofo descreve o Demiurgo (do grego d ēmiourgós, "artesão ou construtor") como a entidade que ordena o caos primordial seguindo modelos geométricos e arquitetônicos perfeitos.
"O Demiurgo, sendo bom e sem inveja, desejou que todas as coisas fossem o mais semelhantes possível a si mesmo... e assim colocou inteligência na alma, e alma no corpo, para que sua obra fosse a mais bela e perfeita possível. " (Timeo, 29e-30a)
Aqui já encontramos, essencialmente, o conceito que hoje possuímos do G.A.D.U.: um princípio computador, benevolente e racional, que imprime harmonia no universo.
O Hermetismo e o "Deus Arquiteto" (Séculos II-III d.C.)
Os textos do Corpus Hermeticum, atribuídos a Hermes Trismegisto, aprofundam esta ideia. No Livro I (Poimandres), Deus é descrito como um "construtor" que plasma o mundo através do *Logos* (Palavra ou razão).
"O Arquiteto do Universo trabalhou como um bom artífice, que, tendo recebido o desenho de sua obra, a executa com cuidado e sabedoria. " (Corpus Hermeticum, Livro IV)
Este conceito influenciou pensadores posteriores, desde gnósticos até alquimistas medievais.
Na Bíblia, embora não apareça o termo "Grande Arquiteto", há referências claras a Deus como "construtor":
- Provérbios 8:27-30 (Versão LXX):
"Quando estabelecia os céus, lá estava eu; quando traçava o círculo sobre o abismo... Eu estava ao lado dele como arquiteto. "
- Jó 38:4-6:
"Onde você estava quando eu fundei a terra?... Quem pediu suas medidas, se você sabe? Ou quem estendeu sobre ela cordel? "
Estas passagens refletem uma visão de Deus como arquiteto e computador, uma ideia que ressoaria séculos depois na maçonaria.
A primeira menção explícita do termo acontece no Renascimento.
Robert Fludd e o "Architectus Magnus Universi" (1617-1619)
O termo exato "Grande Arquiteto do Universo" aparece pela primeira vez na obra do alquimista e rosacruz Robert Fludd, Utriusque Cosmi História (1617-1619). Fludd, influenciado pelo hermetismo e pela Cabala, descreve Deus como:
"O Arquitectus Magnus Universi, que com compasso e esquadra colocou todas as coisas em número, peso e medida."
Esta frase é notável porque antecipa os símbolos maçônicos e estabelece uma ligação direta entre Deus e a arquitetura cósmica.
Os Estatutos dos Maçons Operacionais de Schaw de (1598) antes da Maçonaria Especulativa, nas guildas de construtores já usavam linguagem arquitetônica para se referir a Deus.
Este era um documento-chave da Maçonaria Escocesa e os Maçons eram exigidos da seguinte forma:
"Acredite no glorioso arquiteto do céu e da terra, e observe a sagrada lei cristã. "
Depois, a maçonaria simbólica adapta-o como um princípio universal, não sectário, que permite a convivência de diferentes religiões sob um mesmo tecto simbólico. evitando assim as grandes disputas religiosas da época.
Lemos nas Constituições Franc-Maçônicas o seguinte...
Constituições de Anderson (1723).
"As Constituições dos Maçons Livres" (1723):
"Um maçom é obrigado, por sua condição, a obedecer à lei moral; e se entender corretamente a Arte, nunca será um ateu estúpido nem um libertino irreligioso. Mas embora nos tempos antigos os maçons fossem obrigados a praticar a religião do seu país, hoje se considera mais conveniente obrigá-los apenas àquela religião em que todos os homens concordam: deixar a cada um suas próprias opiniões e cuidar de ser homens bons e leais... sejam quais forem as suas denominações ou crenças."
A Visão Maçônica era clara para a época, fazia dele um símbolo, uma ideia de União e Tolerância.
Por que Adotou a Maçonaria Este Termo?
O século XVIII foi uma época de guerras religiosas (reforma protestante, católicos e outros) as imensas perseguições que custaria a vida de muitas pessoas.
Neste momento de 1717 a maçonaria surgiu como um espaço onde católicos, protestantes, deístas e até mesmo pensadores livres podiam se reunir sem conflitos e debater muitos temas.
O G.A.D.U. na época foi o conciliador, que neutralizou as disputas, não se identificando com um Deus dogmático, evitava choques de pensamento entre religiões enquanto se introduzia a tolerância e o respeito pelo direito.
O compasso, o esquadrão refletiam a perfeição da construção do universo e que o ser humano deveria imitar, acessível através do estudo e da virtude.
Para um cristão: O G.A.DU é o Deus bíblico.
Para um deísta: é a "causa primeira" do universo, sem intervenção milagrosa.
Para um filósofo: Pode ser o Demiurgo platônico ou a Harmonia das Esferas e assim por diante para cada religião ou filosofia.
A chave é que não se impõe uma interpretação única, mas que cada irmão chega à sua própria compreensão da realidade suprema.
No Rito Escocês Antigo e Aceito, por exemplo, proclama-se:
"A Maçonaria adora o Grande Arquiteto do Universo, sob cujo nome estão incluídos todos os nomes que os homens deram à Divindade. "
Esta afirmação resume o espírito do que é o G.A.D.U.
O Grande Arquiteto do Universo não é um dogma, mas um símbolo vivo que representa:
Unidade sob diversidade.
A razão como ferramenta de progresso.
Tolerância como virtude suprema.
De Platão a Anderson, de Fludd aos nossos dias, este conceito serviu para nos lembrar que, além das nossas diferenças, somos todos aprendizes no workshop do universo, trabalhando juntos para construir um mundo mais justo e luminoso.
Que o G.A.DU ilumine nossos caminhos.
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