Você paga pelo que já e seu ! (Por Óscar dos Reis)

O truque econômico mais antigo do mundo: fazer você pagar pelo que já era seu.

Tudo começa com uma mentira tão antiga que já nem parece mentira: a ideia de que alguém está te dando algo em troca do seu trabalho.

Mas o que realmente acontece é isto:
Eles tiram o que é seu, fazem você acreditar que perdeu, e depois vendem de volta como se fosse um privilégio.
Esse é o truque.
O mais velho.
O mais usado.
E o mais invisível.
Há 5.000 anos, os templos sumérios recolhiam parte do grão de cada camponês. Não se chamava imposto, nem pilhagem. Chamava-se "oferenda".

O templo guardava-o.

Anos mais tarde, em época de fome, eles te devolviam esse mesmo grão... mas agora se chamava “salvação”.

Era teu.
Mas agora tinha um preço.
E ainda por cima, agradecias.

Hoje o truque não usa sacos de trigo, mas sim horas de vida.

Trabalhas 8, 10, 12 horas por dia.
Você entrega sua saúde, seu tempo, sua energia mental. Em troca, recebes dinheiro.

Mas então esse dinheiro você usa para reparar os danos causados pelo próprio trabalho:
– fast food porque você não tem tempo,
– comprimidos para dormir porque você não consegue desligar,
– terapia para suportar o chefe,
– férias expressas para continuar a respirar.

Você vendeu seu tempo... para comprar em porções quebradas.

E o pior? Nem sequer o vês.
Porque o teu cérebro não foi feito para detectar o truque.

Richard Thaler (1985) provou isso com a contabilidade mental: tratamos o dinheiro como compartimentos estanques.

Não vemos que tudo faz parte do mesmo ciclo: você trabalha para pagar o que o trabalho tirou de você.

Ellen Langer (1975) falou sobre a ilusão de controle: escolhemos entre empregos, salários ou planos de saúde... sem perceber que todo o sistema já foi projetado para te espremer.

E Samuelson e Zeckhauser (1988) chamaram-lhe preconceito do status quo: preferimos suportar o mal conhecido do que ousar questioná-lo.
Este truque não é um erro. É design.

O sistema te despoja simbolicamente: te convence de que o teu tempo não vale se não for traduzido em produtividade.

Depois você “devolve” o que perdeu, transformado em mercadoria: saúde, lazer, desenvolvimento pessoal...
Eles tiraram-no de ti.
Eles empacotaram-no para ti.
E agora vendem-te.
Como se fosse seu!

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