O ESPIRITO REBELDE ...

 

Lindo dia a todos!
Existe um Deus, existe um Diabo?
"A criação está ordenada, está um caos? Eu mesmo, quem sou eu? Livre ou escravo? O que será de mim? Eu sucumbirei? É o nada que me persegue? É uma eternidade gloriosa o que me espera?

Repetindo assim meus trabalhos, minhas viagens, minhas reflexões, passava sem interrupção do medo da indiferença.

Todas essas filosofias, essas dialécticas, essas teologias, os mistérios práticos que tinha experimentado, os venenos, as presenças horríveis e macabras, as sentenças desesperadas daqueles que estavam de volta de toda a ilusão, o que se podia deduzir de tudo isso?

Eu tinha visto, nos êxtase iniciais, a forma dos deuses da natureza e da ciência.

Como o construtor de pontes de Kipling, bêbado do ópio oculto, por vezes tinha testemunhado as conversas secretas desses seres formidáveis. De tudo isso me restava apenas um cansaço infinito.

O que fazer?
Como adeptos de Benarés, eu teria que pedir de novo à Matéria, apesar de tudo vitoriosa, o elixir do esquecimento?

Fascinado pelo sotaque vivido de suas confidências, escutava com todas as minhas forças.

Finalmente tinha encontrado um homem que não falava em vão; tinha encontrado um verdadeiro experimentador!

Entrevia o fim dos meus dias às tentativas; catava esperança, esperança clara, amanhecer, finalmente.

E Andreas, calmo, fumando bonhomia o seu longo cachimbo flamenco, escuro e liso como um bambu de ópio, continuou a dizer:
– Durante esta crise interior, eu tinha, por outro lado, a temer pela minha segurança pessoal, apesar de tudo parecer tranquilo à minha volta.
Eu sabia que os rancores orientais são máquinas terrivelmente pacientes e sábias; e eu tinha despertado alguns resquemores.
Foi assim.
Minha estrela queria que eu fosse admitido em praticamente todas as associações esotéricas muçulmanas, hindus e chinesas; tântricos Shivaítas, bruxos javaneses, chapéus vermelhos do Butão, montanheses do Nan Chan tinham me iniciado em suas magias.

Conhecia as línguas perdidas, os rituais que só se murmuram ao ouvido, os objetos horríveis que só se conseguem através do crime, as pedras ou as ervas raras cuja busca necessita de meses de peregrinação; tinha vivido em retiros perdidos no fundo da floresta; tinha visto preparar venenos subtis, filtros irresistíveis; tinha acompanhado caçadores destemidos que se atrevem a arrancar das feras as garras, dentes ou pelos que o ritual rejeita se viessem de um animal morto.

No fumo dos holocaustos, no vaho do sangue derramado, muitas vezes me apareceram as formas monstruosas dos deuses do além; meus pensamentos foram muitas vezes confundidos pelo olhar maligno irônico desses seres; diante dos quais os mais fortes e os mais sagazes humanos são apenas pigmeus.

Os evocadores hábeis que, graças aos cálculos de correspondência astutas, prendem estes titãs por um segundo e lhes arrancam uma resposta, são para eles um objeto de zoom e muitas vezes servem-lhes de brinquedos.

Consegui progressivamente me convencer de que só a teoria da magia é ciência exata; sua prática abunda em oportunidades de erro; muitos dados continuam imprecisos.

Quem quiser arrancar à Natureza, pela força, algum poder inédito, joga-se no abraço do Destino; e os seus debates, ainda que soltem um momento a sua tenaz, só levam a torná-lo mais inexorável e mais doloroso.

É necessário a todo o amadurecimento o tempo que lhe é fixado desde a origem.

Se o homem guarda o desejo de todos os poderes, é que possui os rebentos do mesmo.

Mas, demasiado impaciente, faz-os amadurecer através de artifícios, obtendo apenas plantas fracas, destinadas a perecer perante as primeiras rajadas do furacão... "


(Paul Sedir, Inícios)

Comentários