O Filho do Trovão dos Andes!

 

Eu acho que cada vez me estendo mais nas narrativas, como se elas fossem a antessala de um livro...

Mas e aí, "Enquanto não parem de aplaudir (com curtida), eu não paro de cantar (publicar)".
Vicente Fernandez.

Bernardo O’Higgins
O Filho do Trovão dos Andes.


Quando Bernardo O’Higgins nasceu em 1778, poucos suspeitavam que aquela criança ilegítima, marcada pela sombra de um pai poderoso e distante, se tornaria o Pai da Pátria Chilena.

Era filho de Ambrosio O’Higgins, governador e mais tarde vice-rei do Peru, um irlandês que tinha trocado a cruz celta pela cruz de Castela; e de Isabel Riquelme, jovem crioula de sangue nobre mas sem títulos.

Essa dupla raiz – estrangeira e americana, poder e desamparo – seria o símbolo da sua vida: destinado a lutar por uma terra que ainda não sabia a quem pertencia.
A forja maçônica
Quando jovem, Bernardo viajou para a Europa, onde o eco das revoluções ecoava em cada taberna e em cada loja. Foi em Londres que o seu destino tomou forma.

Lá conheceu o venezuelano Francisco de Miranda, o “Precursor” que semeou a ideia de uma América emancipada. Nas salas escuras da Loja Lautaro, entre símbolos velados e juramentos solenes, O’Higgins aprendeu que a liberdade não era uma utopia, mas uma missão.
O lema maçônico que o marcou foi claro:
“Ab homine liber ad patriam liberandam”
(O homem livre para libertar a pátria).
Eu não voltaria a ser só Bernardo. Fazia parte de uma cadeia inicática de libertadores, juntamente com San Martin, Bolívar e outros irmãos, todos filhos do mesmo fogo.
Rancágua: a derrota luminosa
Em 1814, na cidade de Rancagua, enfrentou o exército realista. Resistiu como um leão com apenas alguns milhares de homens.

O fogo devorava as casas, a pólvora esgotava-se, mas ele não cedia. Quando a derrota era inevitável, ele exclamou:
“Aqui eu morro com meus homens!
A pátria será salva!”
Embora o bastião tenha caído, a derrota acendeu a chama. O sacrifício de Rancagua foi a semente do triunfo que viria.
A travessia dos Andes
Três anos depois, ao lado de José de San Martin, levou o seu exército através dos cumes gelados. Não foi apenas um feito militar, mas um ritual de purificação: homens cruzando montanhas como se ascendessem ao altar dos deuses.
Muitos morreram no gelo, mas quando chegaram ao vale, o sol da liberdade ergueu-se sobre eles.
Em Chacabuco (1817), a vitória foi total. San Martinho abraçou-o e chamou-lhe:
“Irmão na glória, irmão na maçonaria”.
O Chile nascia como república.
O Diretor Supremo
Como governante, O’Higgins aboliu os títulos nobiliarios e proclamou que no Chile ninguém seria senhor por nascimento, mas por virtude.
Criou escolas, fomentou a cultura e organizou uma marinha que levaria a liberdade para além das suas costas.
A figura de Lord Cochrane, o corsário britânico convertido em almirante do Chile, foi peça fundamental neste projeto.

Mas o seu republicanismo levou-o a enfrentar a aristocracia crioula, que via nele um reformador muito radical.
O filho ilegítimo, que se tornou Director Supremo, ousava falar de igualdade. Aquilo era imperdoável.
A queda e o exílio.
Em 1823, pressionado por seus inimigos, renunciou ao poder. Partiu para o exílio no Peru, onde viveu seus últimos anos em Lima.
Lá, longe da pátria que ajudou a forjar, cultivou a serenidade de um sábio maçom, convencido de que o trabalho dos homens se mede não em cargos nem honras, mas no fogo que deixam aceso.
Morreu em 1842, mas no Chile o seu nome tinha ficado gravado como Pai da Pátria.
A história secreta
Diz-se que antes da Travessia dos Andes, quando alguns oficiais duvidaram do sucesso, San Martin falou com O’Higgins em privado. O chileno, com olhar de aço, disse-lhe:
“General, se você avançar, eu marcho com você;
se você parar, eu sigo-o;
mas se você recuar, eu o mato”.
San Martinho sorriu. Não havia como voltar atrás. E assim, entre juramentos maçônicos e palavras de aço, selou-se uma das campanhas mais gloriosas da América.
Legado simbólico
Bernardo O’Higgins foi mais do que um libertador. Foi um construtor de símbolos:
Transformou as montanhas em colunas maçônicas, testemunhas da iniciação de um continente.
Ele fez do sacrifício em Rancagua um altar de mártires.
Transformou o ideal republicano em lei suprema: a pátria livre, igualitária e fraterna.
Sua frase em latim
“Libertas patriae suprema lex esto”
(A liberdade da pátria seja a lei suprema).

Bibliografia
Villalobos, Sergio. O’Higgins: Pai da Pátria. Editora Universitária, Santiago do Chile, 1980.
Collier, Simon. Ideias e Política da Independência do Chile, 1808-1833. Imprensa da Universidade de Cambridge, 1967.
Barros Arana, Diego. História Geral do Chile. Editora universitária.
Pizarro, Alfredo. A Loja Lautaro e a Independência da América. Fundo de Cultura Econômica, 2005.


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