Prancha Pública, Artigos diversos.
Na sequência da Prancha apresentada por um I:. intitulada “Sobre a Impermanência”, pareceu-me ser consistente escrever sobre a mudança e os processos que lhe estão associados, já que está subjacente à impermanência.
Deixem-me começar por transcrever algumas frases soltas que creio poderem servir para enquadrar o tema:
Quando sentimos a necessidade de uma mudança profunda, normalmente vemo-la como algo que deve ocorrer, mas não em nós.
Nas funções em que exercemos autoridade, sejamos pais, professores, chefes, ou outra coisa qualquer, somos particularmente atentos à necessidade de mudar dos outros.
Esses esforços falham frequentemente e é comum que respondamos aumentando a pressão. Esta luta raramente traz consigo mudança ou excelência. – Robert E. Quinn
Se nos conseguíssemos mudar a nós próprios, então as tendências do mundo também mudariam.
Conforme a nossa mudança, assim muda também a atitude do mundo perante nós… não precisamos de esperar que os outros mudem.” – Mahatma Gandhi
A mudança não é algo opcional… é inevitável.” – Barbara Sher.
A mudança pode ser um desafio, mas pode também ser uma ameaça. Aquilo em que acreditamos pavimenta o nosso caminho para o sucesso ou insucesso.” – Marsha Sinetar.
A espécie que sobrevive não é a mais forte, nem sequer a mais inteligente; é sim a que se adapta mais facilmente à mudança. – Charles Darwin.
Todos já aceitámos que a mudança é inevitável. Mas todos ainda a encaramos como a morte ou pagar impostos – deve ser adiada o mais possível e se for possível, fiquemos na mesma.
Contudo, no período em que vivemos o normal é a mudança e não a permanência. – Peter F. Drucker.
Mudemos antes que tenhamos de mudar. – Jack Welch.
A mudança é difícil porque tendemos a sobrevalorizar o que temos e a desvalorizar o que poderíamos ter se mudássemos. – James Belasco e Ralph Stayer.
Não há nada mais difícil de assumir, mais arriscado de dirigir, ou com maior incerteza no resultado, do que a liderança na mudança. – Niccolo Machiavelli.
Choque com o futuro é o resultado do stress e desorientação que induzimos nos indivíduos, quando os submetemos a demasiadas mudanças num curto espaço de tempo. – Alvin Toffler.
A vida é constituída por uma série de mudanças naturais e espontâneas. Resistir-lhes só serve para trazer frustração e tristeza. Deixemos que a realidade seja a realidade. Deixemos as coisas fluírem naturalmente na direcção que tiverem de tomar. – Lao Tzu.
Quando a taxa de mudança nos mercados for maior que a da organização, o fim está à vista. – Jack Welch.
Entremos em matéria…
A vida vai acontecendo e o que acontece é muitas vezes denominado de mudança. Algumas são resultado da evolução biológica e da passagem do tempo, no que é o ciclo natural do nascimento, crescimento, decrescimento e morte. Outras resultam de fatos sob o nosso controlo e esforço ou da interacção com familiares, amigos, etc. Finalmente, há um terceiro grupo que resulta de fatos totalmente fora do nosso controle.
As nossas experiencias resultam de fatos externos ou internos que seguem um caminho linear, regulado pelo tempo, pelo espaço, ou pelas estruturas sociais. Podem também resultar de aspectos emocionais, psicológicos ou até das nossas lutas internas e externas. Podem ser subtis ou graduais, fáceis e bem-vindas ou difíceis e exigentes. Podemos encará-las e à mudança que implicam, com aceitação e adesão ou com protesto e resistência.
A vida é constituída por uma série de mudanças naturais e espontâneas. Resistir-lhes só serve para trazer frustração e tristeza. Deixemos que a realidade seja a realidade. Deixemos as coisas fluírem naturalmente na direcção que tiverem de tomar.
O perigo de mudar sem verdadeiramente experimentarmos a mudança é o de essa mudança não chegar a ocorrer. Se estivermos focados na mudança em si mesmo e/ou demasiado ansiosos por resolver um problema, podemos perder a mensagem que o processo contém, bem como o seu aspecto transformativo. Daqui resulta que é importante não só a mudança, mas também a forma como mudamos. Mudanças radicais sem um processo evolutivo resultam frequentemente em cenários “déjà-vu” e no reforço de comportamentos que pretendíamos mudar. Para que a mudança seja real e tenha um efeito efectivo, é necessário que aprendamos a trabalhar realmente com ela e não a evitá-la sempre que possível. Já agora, contemplá-la também não costuma dar resultado.
Os antigos filósofos diziam que tudo muda permanentemente (impermanência).
O I Ching, o Livro da Mudança, é um texto Chinês que tem servido como ferramenta para tomada de decisões e para tentar prever o futuro, por mais de cinco mil anos.
Apesar de tudo ser transitório e estar em constante mudança, o conceito e o seu processo evolutivo respeitam as leis naturais, que pelas suas propriedades cíclicas e repetitivas, fazem da mudança um processo que não muda (impermanência).
O I Ching contem uma simbologia cujo objectivo é ajudar-nos a encontrar ordem dentro dos acontecimentos quase aleatórios da vida.
Basicamente, todas as situações na vida ocorrem segundo seis estagios, que embora sejam mutáveis, são previsíveis:
- começar a ser,
- início,
- expansão,
- evolução para atingir o potencial mais alto,
- potencial mais alto,
- regressão.
Podemos estabelecer um paralelismo com os seres:
- concepção,
- nascimento, - crescimento,
- evolução para a maturidade,
- maturidade,
- envelhecimento e
- morte.
Estes estagios são também aplicáveis ás organizações, aos produtos e a muitas outras coisas que nos rodeiam.
Tudo parece ter um inicio e um fim e nesse intervalo está em constante mudança.
Apesar da mudança poder interromper o decurso normal das nossas vidas (e fá-lo), constitui também uma oportunidade e um desafio para analisar o que fazemos e o que poderemos fazer e para alterar esse estado, se assim o entendermos. Pode até servir para nos mantermos como estamos e assim permitir-nos melhores escolhas e decisões.
Afastar ou negar a mudança e o que nos pode oferecer, pode ser uma oportunidade perdida de aprendizagem ou de descoberta. A chave está em entender e aceitar que a mudança é a regra e não a excepção e que mesmo que não aceitemos mudar, estaremos ainda assim a fazê-lo.
Quando aceitamos esta realidade e aprendemos a lidar com ela, torna-se muito mais fácil ajustar-nos, já que o fazemos com a consciência de que estamos a mudar de forma controlada, num processo que não muda.
Colocando a mudança de lado, vejamos a outra parte da equação – a complexidade do desenvolvimento da personalidade individual.
O desenvolvimento da personalidade é função de três variáveis ou sistemas:
- O corpo (soma),
- A psique (psyche), e
- o comunitário ou social (ethos).
Existem diversas teorias sobre o desenvolvimento da personalidade, mas as do psicanalista Erik Erickson são consideradas das que melhor nos podem ajudar a compreender a mudança no contexto do ciclo da vida. A sua teoria ajuda a clarificar como é que um individuo adere e processa a sua mudança intrínseca o que permite perceber se a pessoa está à altura para fazer mudanças em si próprio.
Esta teoria identifica oito estagios pelo qual o individuo passa, desde o nascimento até à velhice. Todos estão presentes à nascença, mas desenvolvem-se em função de uma dicotomia entre o pessoal e o social.
Cada estagio é marcado por uma crise psicossocial entre uma vertente positiva e uma vertente negativa. As duas vertentes são necessárias, mas é essencial que se sobreponha a positiva à negativa.
A forma como cada crise é ultrapassada ao longo de todos os estadios influenciará a capacidade para se resolverem conflitos inerentes à vida, bem como a atitude perante a evolução (mudança). Para Erickson, o conflito e a crise psicossocial são positivas, já que são fontes de crescimento, força e compromisso.
A forma como cada individuo evolui ao longo deste trajeto de oito estagios, pode determinar que seja mais ou menos confiante e que tenha uma maior ou menor aversão ao risco.
Confiança e atitude perante o risco são dois fatores fundamentais que balizam a forma como lidamos com a mudança.
Para além desta perspectiva mais teórica, há diversos fatores de ordem pratica que influenciam se e como lidamos com a mudança.
O temperamento, ou seja, a nossa atitude perante a vida, que faz de nós maleáveis e adaptáveis, envergonhados e medrosos, ou difíceis e inflexíveis, influencia de forma decisiva a forma como vemos o mundo e os outros e consequentemente a nossa capacidade de nos adaptarmos.
Os pensamentos, atitudes e comportamentos de todos aqueles que nos rodeiam, podem influenciar a nossa forma de pensar e de agir.
Por exemplo, amor, aceitação ou optimismo induzem confiança e esperança, ao contrário de críticas, pessimismo e outras atitudes negativas.
O mesmo papel podem desempenhar experiências passadas: uma mudança com sucesso gera otimismo, abertura e confiança.
Os valores familiares e sociais são sempre herdados pelo individuo, desde o princípio da sua vida.
O medo da mudança e de assumir riscos são contagiosos e interferem na forma como o individuo encara a mudança e limitam o que é capaz de fazer.
Para muitos a simples ideia de mudar é esmagadora e geradora de ansiedade, constituindo algo a evitar a todo o custo.
Mas quais são realmente as implicações da mudança quer no plano individual, quer no grupo ou organização. O que é que devemos e/ou pudemos tentar gerir?
Edgar Henry Schein (Ph.D., Psicologia Social, Harvard University) propõe-nos um modelo conceptual para a mudança e suas implicações. Segundo ele, a mudança gera normalmente dois tipos de ansiedade:
A ansiedade associada ao ter de mudar (também chamada “Ansiedade de Aprendizagem”, já que isso implica ter de aprender e deixar o que sabemos por o que não sabemos.
Esta ansiedade pode ser gerada e alimentada por diversas razões, toda elas válidas:
- Receio de perder poder e/ou posição.
- Receio de sermos temporariamente incompetentes
- Receio de não sermos capazes de mudar (Princípio de Peter), ou seja, o receio de já termos atingido o nosso limiar de competências que evoluir implique passarmos a ser incompetentes.
Finalmente, o receio de perda de identidade e de pertença ao grupo.
Mas a mudança também pode induzir a chamada “Ansiedade de Sobrevivência”, ou seja, o medo sobre o que pode acontecer se não mudarmos.
Como é evidente, estamos perante duas ansiedades que jogam em sinal contrário – “eu estou bem como estou, mas o que é que acontecerá se eu não mudar”.
Parece também ser evidente que a mudança fica claramente dificultada enquanto a Ansiedade de Aprender for superior à de Sobrevivência e a forma de conseguirmos que o processo evolua é precisamente “jogar” com estas duas variáveis.
Como???
Para baixar a Ansiedade de Aprendizagem, há algumas alternativas.
- Desdramatizar o processo, envolvendo os implicados e criando condições para que possam participar.
- Estabelecer programas de formação e de apoio à aquisição e implementação de novas competências.
- Gerir a mudança para que não seja brusca ou implique rupturas.
- Implementar mentalidades que permitam errar… a chamada gestão do erro.
Outras…
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