A TAREFA DO ANTIGO E ACEITO RITO ESCOCÊS: UMA ESPIRITUALIDADE SECULAR
A França orgulha-se de possuir duas características nacionais: excepcionalidade cultural e secularismo.
Se o conceito de secularismo é incompreensível no
mundo anglo-saxão, ele tem sua tradução exata
em italiano, espanhol e português.
Isso se explica pela identidade religiosa dos países latinos, governados por muito tempo pela religião católica, que ainda exerce certa influência, e viu a necessidade de tomar medidas que levassem à sua emancipação.
O secularismo tem dois significados essenciais: um social e outro filosófico. Mas também tem uma dimensão
espiritual, como veremos.
Filha do Iluminismo, a ideia secular, em germe durante os séculos XVI e XVII, desenvolveu-se durante o século XVII.
Sob a influência dos maçons da época, o princípio da liberdade de consciência
foi inserido no texto da Constituição dos Estados Unidos, em 1787, antes de ser proclamado pela Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, promulgada na França em 1789, tornando-se posteriormente universal.
Nesse sentido, a Concordata com Napoleão, de 1806, já limitava o poder da Igreja. Dependendo da intensidade das forças adversas, o secularismo tem que ser, dependendo do caso, combativo, até agressivo, defensivo ou simplesmente militante. Sua época de ouro foi a Terceira República Francesa.
Em 1882, o irmão Jules Ferry teve aprovada a lei que estabelecia o caráter gratuito, obrigatório e laico do ensino público. O paralelo com o que aconteceu na Argentina é surpreendente, pois lá a Constituição de 1853 também se completou em 1883 com o estabelecimento da laicidade, ensino obrigatório e gratuito.
O secularismo tornou-se um slogan que só pode ser
compreendido em oposição ao clericalismo triunfante do século XIX, quando a Igreja tentou dirigir os Estados e impor diretrizes políticas cristãs. Para a maioria republicana do início do século XX, que na França contemplava a separação das Igrejas e do Estado por meio da lei de 9 de dezembro de 1905, não se tratava de qualquer desejo de esmagar as religiões, mas de limitar o poder da Igreja Católica, aliada aos monarquistas.
O Ato de 1905 é explícito: "A República não reconhece (...) nenhum culto (em particular)" (art. 2º). Doravante,
não haveria Igreja na França com privilégios jurídicos e todas as Igrejas (presentes ou futuras) são
legais.
No plano filosófico, não me deterei em um conceito retrógrado e caricatural de secularismo, alimentado pelo ódio às religiões, pela vingança contra seus representantes e pelo desprezo pelas consciências presas em suas crenças, enfim, a confusão entre comportamento e uma verdadeira filosofia.
Ao defender uma ideologia ateísta sem discrição, caímos no secularismo, um pseudo-secularismo que faz do antidogma outra forma de dogma e que reivindica para si a tolerância que nega aos outros.
Pelo contrário, o verdadeiro secularismo é uma faculdade de caráter ao mesmo tempo que uma virtude moral e cívica, porque as qualidades de modéstia, sinceridade e
inteligência que ele exige são nobres.
Sendo um princípio moral, o secularismo é a tolerância e o respeito pelos outros que se harmonizam perfeitamente com os Princípios do Rito Escocês Antigo e Aceito.
Como sinal de equilíbrio interior, implica autonomia de
pensamento, sem recorrer a verdades consideradas irrefutáveis e não verificáveis, como as oferecidas pelas religiões.
É uma busca leal e prudente da verdade pessoal, bem como um esforço sincero para reconhecer em cada homem uma parte da verdade, mesmo que ele seja um adversário.
A laicidade não será, então, um dos aspectos do direito à diferença, não se limitando à cor da pele?
Por ser uma ética que respeita integralmente o homem, ele não pode deixar de respeitar seu íntimo naquilo que é mais íntimo e, portanto, não proíbe a fé ou a oração. Além disso, não pode deixar de enriquecer tentando compreender outras formas de pensamento.
No que diz respeito à espiritualidade, ela também tem suas contrapartidas, como a que consiste em negar a ciência e tomar partido com o irracional, confundindo o espiritual com o irracional. Reconhecer a existência do Mistério é uma coisa; mas fingir levantar o véu que o cobre corre o risco de afundar-se no sobrenatural, no gosto por adivinhações, oráculos e demonstrações a posteriori, em quantos casos o orgulho de uns pode explorar a credulidade e a angústia de outros.
O termo "espiritualidade" foi distorcido e mantém uma conotação religiosa, quando, na verdade, não implica necessariamente a adesão a uma religião, nem a impede.
A espiritualidade não é uma fuga da realidade, mas emana da busca do que pode estar por trás do aparente, de uma busca pela verdade, de uma aspiração ao absoluto.
Consiste em uma ligação com os valores que tendem para o infinito, o sagrado; é a vida interior, a marcha pessoal em direção ao Belo, ao Bem, ao Verdadeiro. Tem a mesma natureza da busca da Palavra perdida.
O Rito Escocês Antigo e Aceito é caracterizado pela espiritualidade.
O Manifesto do Convento de Lausanne, de 1875, redigido pelo Grande Comandante do Supremo Conselho da França Adolfo Crémieux, tornou-se, a partir dessa data, a referência de todos os Conselhos Supremos regulares do mundo.
Começa com esta afirmação: "A Maçonaria proclama, como tem feito desde a sua origem, a existência de um Princípio criativo sob o nome do Grande Arquiteto do Universo".
O Credo Maçônico é que existe uma causa primeira, da qual o homem e o universo são efeitos.
No mundo contemporâneo, se o escotismo tem um papel insubstituível, é porque é um sistema iniciático que trabalha para glorificar um Princípio transcendente.
A invocação do Grande Arquiteto do Universo dá aos adeptos o sentimento de participação em cerimônias que tendem para o que está além do humano, ajudando-os a encontrar a plenitude do sentido de sua vida.
Sem ser uma oração ou um ato de fé, transforma o templo em um espaço sagrado e não o coloca em um estado de receptividade interior.
Esta invocação vem completar as invocações à Sabedoria, Força e Beleza: A Beleza alude à espiritualidade, elevando a Sabedoria ao maravilhoso e ensinando à força o ritmo medido da harmonia.
O escotismo não rejeita nenhum sistema ou qualquer doutrina, mas, como detalha o mesmo manifesto:
"A maçonaria recebe todo profano, quaisquer que sejam suas opiniões políticas ou religiosas, das quais ele não precisa se preocupar, desde que seja um homem livre e de bons costumes. Aos homens para quem a religião é a suprema consolação, ele diz: cultivai a vossa religião sem inconvenientes, segui os ditames da vossa consciência".
O Rito Escocês Antigo e Aceito confia a cada um definir Deus como sua consciência o faz conceber, uma vez que toda crença sincera tem direito a respeito. Por isso, seu lema é: Deus meumque Jus (Deus e meu Direito).
O caminho escocês, que integra a dúvida construtiva e a busca de verdades universais veladas por símbolos, conduz o adepto a um questionamento mais amplo, que o leva a encontrar no estudo da Tradição o fio de Ariadne que o conduzirá das trevas, para a luz.
Da mesma forma que a maçonaria escocesa proclama sua espiritualidade, ela também declara sua adesão ao secularismo, como também aponta o Manifesto de 1875: "A maçonaria não é uma religião nem é um culto: É por isso que ele deseja a instrução leiga."
E o Manifesto termina com a seguinte apoteose: "Toda a sua doutrina está contida neste belo mandamento: amar o próximo". É tão verdadeiro quanto que ninguém é dono do amor ou do espírito, já que ambos pertencem ao universal.
Com o Rito Escocês Antigo e Aceito estamos diante de uma espiritualidade secular que pode ser definida como a eternidade de hoje.
Essa definição pode parecer paradoxal, mas fica clara se conhecermos a etimologia do adjetivo "leigo", que vem do grego laicato: "o que pertence ao povo, ao povo".
Deve-se lembrar que "o povo" designava a população do mundo antigo uma vez conhecida; para toda a humanidade. O sinônimo latino de leigo é "universal", por isso é o Rito mais praticado no mundo, assim o valor da expressão "espiritualidade leiga" será melhor compreendido. E, como todos sabemos, o universalismo secular é o oposto da intolerância que caracteriza o anticlericalismo, o totalitarismo, o fundamentalismo e o fundamentalismo. Ser secular neste sentido significa que o Rito está aberto a todos os homens de boa vontade, crentes ou não crentes, que vivem em harmonia sob os auspícios da verdadeira espiritualidade.
É adógmático evitar cair na armadilha do dogmatismo.
Ariadne, na Mitologia Grega, ajudou Teseu a sair do Labirinto de Creta desenrolando um fio pelo caminho. Essa simbologia remete ao processo de guiar as pessoas ao seu passado com a Terapia de Vidas Passadas, e ajuda-las a retomar o caminho do aprendizado individual, o fio da meada de suas vidas.
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