O antissemitismo é tão antigo na sociedade quanto o judaísmo e iniciou-se pelo ódio de populações de certos locais à migração de judeus advinda de suas diásporas — originalmente: expulsões, escravizações e fugas de povos judeus de seus locais de origem.
Na contemporaneidade, o antissemitismo tornou-se mais intenso na Europa, e o ápice dessa forma de preconceito deu-se durante o Holocausto — período em que mais de seis milhões de judeus foram mortos nos campos de concentração, além de milhões de prisões e violações dos direitos civis judaicos promovidas pelo nazismo do ditador totalitário Adolf Hitler.
Utilizamos o termo antissemitismo para designar o ódio e a aversão contra judeus por conta dos eventos históricos que resultaram na migração desses povos para vários cantos do mundo, o que surtiu nas populações nativas desses territórios um sentimento xenofóbico de invasão estrangeira. No entanto, os judeus não são os únicos povos semitas. Na contemporaneidade, os semitas são judeus e árabes. Na Antiguidade, esses povos eram fenícios, hebreus (judeus), babilônicos, arameus, assírios e outros que, no terceiro milênio antes de Cristo, deslocaram-se da Península Arábica para a Mesopotâmia.
Segundo o linguista brasileiro Rosário Farâni Mansur Guérios, professor emérito da Universidade Federal do Paraná nas décadas de 1970 e 1980, o termo semita como palavra para designar os povos do Oriente Médio que vieram para a Mesopotâmia foi cunhado pelo historiador alemão moderno August Ludwig von Schloezer, em 1871. Schloezer buscou referências bíblicas para definir a ascendência comum de tais povos que, apesar das diferenças religiosas e tradicionais, compartilhavam uma unidade, que, segundo o Antigo Testamento, era o fato de serem todos descendentes de Sem, filho de Noé.
O que é antissemitismo?
O antissemitismo sempre foi utilizado para expressar a aversão preconceituosa e xenofóbica contra os judeus. A palavra “judeu” originou-se na Antiguidade grega para designar os povos que habitavam o Reino de Judá. A religião monoteísta dos povos de tal reino também era expressa pela palavra judeu, da qual derivou judaísmo. O radical dessas palavras foi originado do termo grego ioudai, derivado, por sua vez, do hebraico yehudy. Povos de origem semelhante e mesma religião habitavam um território próximo, ao sul de Judá, chamado Israel.
Acontece que os povos hebraicos, também chamados judeus, foram escravizados pelos egípcios na Antiguidade. Segundo o “Antigo Testamento”, eles foram libertos pelo profeta Moisés, que teria sido guiado por Deus para libertar aquele povo da tirania egípcia tendo aberto o Mar Vermelho para que a caravana pudesse passar. Essa primeira fuga ficou conhecida como diáspora, e todas as fugas e dispersões desses povos ao decorrer da história recebem também esse nome, utilizado para designar uma migração em decorrência de perseguições políticas, sociais e religiosas.
Os antigos povos hebreus, escravizados pelos egípcios e habitantes de Judá, foram expulsos desse reino com a ascensão do Império Grego Macedônico promovida pelas conquistas de Alexandre Magno (Alexandre, o Grande). Eles promoveram um levante contra o Império Macedônico de Alexandre e fundaram o Reino da Judeia. A Judeia, no entanto, ficou submetida mais tarde ao Império Romano, e essa submissão levou os judeus a uma nova diáspora ocorrida durante a oficialização do cristianismo como religião oficial do Império Romano no século II d.C.
Sem terras e dispersando-se pelo Ocidente, os judeus fundaram em sua religião e sua origem étnica uma espécie de sentimento nacional de pertencimento patriótico para preservar a sua tradição e origem. Por isso, os judeus hoje costumam denominar-se assim antes de expressarem o seu país de origem, como judeus brasileiros ou judeus alemães. Também existem judeus ateus, que não comungam a crença na religião judaica e não acreditam em Deus, mas encontram no judaísmo a sua origem étnica.
Por que os judeus são tão odiados?
Justamente por não terem um território, os judeus que se dispersaram pela Europa fugindo das perseguições não viveram da agricultura, como era comum entre os povos medievais. A sua subsistência era retirada do comércio, o que os permitiu acumular dinheiro ao longo do período medievo, sendo que a prática da usura (obtenção de lucro por meio do empréstimo), condenada pela Igreja Católica até o século XVII, era comum entre eles. Também foram os judeus os fundadores dos primeiros bancos.
A ascensão financeira dos judeus por meio da usura e dos bancos despertou a raiva dos europeus, em especial os católicos, que passaram a hostilizá-los, criando um estereótipo de que eles eram avarentos, ardilosos, hostis e conspiradores. A partir do século XVII, então, cria-se o antissemitismo moderno, que ficou representado inclusive na peça O mercador de Veneza, do dramaturgo e tragediógrafo inglês William Shakespeare, que evidencia a perseguição sofrida por um mercador judeu pela população.
No século XIX, o antissemitismo era comum em nações europeias, em especial na Alemanha. Havia um movimento alemão antissemita, que culpava os judeus pela miséria da população que eles julgavam ser originalmente alemã, baseado na mitologia dos árya, povos de origem germânica que teriam fundado os maiores impérios germânicos, como a Prússia.
Fundou-se então uma ideologia antissemita que colocava no crescimento econômico judeu a responsabilidade pela fome e pelas crises alemãs, o que serviu mais tarde para que Hitler perseguisse, prendesse e matasse milhões de judeus, sob a justificativa de uma higienização étnica que livraria a Alemanha de suas mazelas.
O que foi o holocausto?
O termo holocausto origina-se do hebraico antigo para designar o sacrifício, também denominado em hebreu como shoah. Pode ser o sacrifício de um filho, como acontece em “Gênesis”, capítulo 22, versículo 2, em que Deus testa a lealdade de Abraão propondo a ele que sacrifique seu filho Isaque, em nome da fé. No entanto, a palavra holocausto ganhou outro significado no século XX, sendo empregada para designar o sacrifício de milhares de judeus, iniciado com a chamada solução final implantada pelo governo nazista.
Na década de 1920, os alemães judeus começaram a ser mais integrados na sociedade alemã por conta do período republicano iniciado com a República de Weimar, que pôs fim ao período imperial alemão (II Reich), baixou uma constituição (a Constituição de Weimar) e estabeleceu um Estado democrático de direito.
Essa integração dos judeus na sociedade por meio dos direitos constitucionais, somada ao antissemitismo e ao ódio da direita conservadora, fez crescer o Partido Nacional Socialista dos Trabalhadores Alemães (der Nazionalsocialistische Arbeiterpartei, de onde deriva a sigla Nazi, de Nazional, que significa nacional). O pequeno partido beneficiou-se da crise financeira em que a Alemanha encontrava-se após o fim da Primeira Guerra Mundial e dos prejuízos causados ao país pelo Tratado de Versalhes. Adolf Hitler, um militar ainda pouco conhecido no meio político alemão, aparece com ideias de revalorização da cultura e da identidade patriótica alemã a fim de restabelecer a ordem econômica do país.
Para unir o povo alemão junto a ele, o futuro ditador totalitário procurou nos judeus o inimigo comum da sociedade alemã por ser, na ótica nazista, a principal causa dos problemas alemães. A partir daí, tem-se o início da grande intensificação do antissemitismo pela extrema direita alemã que culminou no holocausto.
Com a chegada de Hitler à presidência via voto popular em 1933, as medidas antissemitas promulgadas pelo governo intensificaram-se. No início, foram apenas investigações e prisões de líderes da comunidade judaica. Junto a isso, havia uma propaganda oficial do governo alemão e discursos de Hitler defendendo uma soberania alemã que excluía a participação dos judeus na sociedade, sendo que, ainda em 1933, houve também a construção do primeiro campo de concentração em Munique. Nele foram internados ciganos, homossexuais, testemunhas de Jeová e comunistas, além dos judeus.
A partir de 1935, a ofensiva contra os judeus intensifica-se e começa a haver prisões em maior quantidade e extremamente arbitrárias, isolamento dos judeus nos chamados guetos das cidades e confisco de bens, além da intensificação da construção de campos de internação para trabalhos forçados, os chamados campos de concentração. Nesse momento, apesar de haver mortes nos campos, o genocídio por meio da câmara de gás ainda não havia iniciado.
Em 1941, com a superlotação dos campos de concentração, uma ordem do alto comando nazista é enviada ao oficial Reinhard Heydrich, determinando que ele elaborasse um plano de extermínio dos judeus que residiam nos territórios alemães. Apesar de somente ser implantada de fato em 1941, a ideia de extermínio já existia na fala de Hitler desde a década de 1920, aparecendo inclusive no seu livro, Mein Kampf.
Antes da execução final, havia um plano de deportação de judeus para Madagascar, que foi abandonado por ser inviável. Com a ordem da solução final, a intenção era prender judeus de territórios dominados, muitos dos quais haviam migrado para esses devido à perseguição desde 1933, levá-los para os campos e aniquilá-los com a utilização do ácido cianídrico, um composto químico extremamente volátil, que, pela rápida dispersão em um ambiente fechado, é capaz de corroer as vias respiratórias de pessoas em poucos minutos.
Estima-se que morreram, no período da solução final (1941-1945), aproximadamente seis milhões de judeus. Esse fato ficou conhecido como holocausto judeu ou, simplesmente, holocausto.
Noite dos Cristais
Um dos precedentes do holocausto foi a Noite dos Cristais. Na noite de 9 para 10 de novembro de 1938, forças paramilitares da SA (Sturmabteilung), que eram destacamentos não militares oficialmente comandados por Ernst Röhm, um oficial do exército alemão, juntamente com populares que apoiavam o nazismo, promoveram uma noite de saques, pilhagem e destruição do patrimônio de judeus.
O evento ficou conhecido como noite dos cristais devido à quantidade de vidro quebrado (de vitrines e janelas de lojas, mercearias, barbearias e casas de judeus) que ficou no chão na manhã do dia 10 de novembro. Algumas fontes históricas apontam que na ocasião morreram 36 judeus, outras apontam que o total de mortos chegou a 91.
A noite dos cristais foi incitada pelo governo nazista, que noticiou a morte do diplomata alemão Ernst von Rath em 1938, em Paris, por um judeu, Herschel Grynszpan.
As autoridades alemãs não interviram e deixaram que as pilhagens ocorressem em cidades alemãs, conferindo à população o suposto direito de agir contra os judeus.
Antissionismo
O sionismo é um movimento judeu que reascendeu no século XIX. Justificados pela expulsão de territórios e diásporas vividas pelos judeus desde a Antiguidade, os sionistas pretendiam reocupar o território da Palestina, sua terra natal, a fim de construir um Estado-nação que abrigasse novamente essa etnia dispersa pelo mundo.
O termo sionista deriva da palavra bíblica sion, que designa “Jerusalém” (cidade sagrada para judeus, muçulmanos e cristãos) e judeus. A intenção do movimento era a retomada do território da cidade de Jerusalém e a nova consolidação do povo judeu lá.
Havia forte oposição ao sionismo entre os não judeus e até por parte de judeus, que percebiam que a ocupação da Palestina causaria conflitos com muçulmanos árabes que viviam lá há muito tempo. Os judeus assimilados, que se integravam à cultura dos locais onde viviam, eram os maiores opositores do movimento sionista. A filósofa judia Hannah Arendt, de família judia assimilada, reintegrou-se à cultura judaica e chegou a participar do movimento sionista, tendo abandonado-o na década de 1940 por conta de divergências com lideranças.
A consolidação da profecia sionista deu-se com a criação do Estado de Israel, promovida pela ONU em 1948, visando evitar um novo holocausto. O problema é que os palestinos (de maioria muçulmana) que já viviam no atual território de Israel não aceitam a imposição da hegemonia judaica, o que causa conflitos e guerras desde o ano de 1948.
Créditos das imagens
[1] Daniel Ullrich, Threedots/Commons
[2] xiquinhosilva/Commons
[3] Mitramind/Commons
Comentários
Postar um comentário