A Rosa da Loja: História da Duquesa de Bourbon

 

Paris, 1775. Nas altas câmaras do Hôtel de Toulouse, uma sala de espelhos repleta de damascos vermelhos e emblemas herméticos fica silenciosa. Velas trêmulas projetam sombras que lembram colunas antigas. Entre os presentes — sábios, nobres, poetas e filósofos — ergue-se uma figura revestida de veludo negro e rendas marfim: Louise Marie Thérèse Bathilde d'Orléans, Duquesa de Bourbon, mãe do jovem Duque de Enghien e prima do próprio rei de França.


Seu olhar é sereno, mas firme.
No centro da sala, sobre um pedestal de mármore, descanse um compasso entrelaçado com uma rosa aberta.

A loja feminina que nascerá esta noite não será um simples círculo de damas reunidas para a galantaria cortesã.

Será um templo de símbolos, um santuário de inteligência, um ato de desafio contido entre sorrisos e leques. E ela, Bathilde, será a sua grande professora.

A cerimônia começa com uma leitura baixa do Salmo 127: "Se o Senhor não edificar a casa, em vão trabalham os que a edificam".

As irmãs da loja La Candeur abaixam a cabeça. Suas mãos cruzam o peito, como escudos de lealdade.
Mas Bathilde não precisa de juramentos: sua presença é suficiente.
Leu Helvétius, Rousseau, debateu com Madame Geoffrin e jantou com Diderot.
Sua mente livre e refinada escapou das muralhas douradas da sua linhagem.

Durante anos ele suportou a ignorância envolvida em seda, a devoção oca dos salões cortesãos. Mas esta noite tudo muda.

A Duquesa assume o martelo cerimonial e levanta-o com gesto solene.
Os sinos de Notre-Dame soam ao longe, como se a cidade inteira aprovasse a fundação de algo mais puro, mais verdadeiro.

Sob sua liderança, a loja se torna um farol para as mulheres ilustradas da França.

A princesa de Lamballe, Madame Helvétius, a esposa do futuro Philippe Égalité.
Não é raro ver alguma delas a falar sobre os mitos de Eleusis ou sobre o simbolismo da Arca de Noé enquanto segura uma taça de vinho ou acaricia um medalhão gravado com uma estrela flamigeira.
Nessas noites, as senhoras não falam apenas de moda ou versos: elas se instruem em geometria moral, em filosofia sagrada, na arquitetura da alma.

Voltaire, velho e venerável, dedica-lhe uma epístola em verso.

Chama-a de "A Rosa do Templo", e as suas palavras circulam como sussurros entre as paredes do Grande Oriente.

A maçonaria de adoção, sob seu impulso, deixa de ser uma simples imitação simbólica: transforma-se em uma via legítima para o pensamento feminino em uma época de cadeados e gaiolas.

Mas os ventos da revolução sopram em breve.
Logias dissolvem-se, espadas substituem os símbolos. Bathilde torna-se vítima do seu sangue real e, no entanto, nunca renega o seu passado iniciático.

Na prisão da Revolução, enquanto o eco da guilhotina silencia ruas inteiras, a duquesa lembra as palavras da sua iniciação: "A verdade é uma luz que não pode ser apagada, mesmo que os templos caiam. "

Viveu até 1822.
Morreu em reclusão voluntária, tornou-se benfeitora dos pobres, nunca desistindo de sua busca pela luz.

Dizem que, quando morreu, o anel dele não usava jóia nem escudo nobiliario.
Apenas um símbolo: um triângulo inscrito com as letras L•V•X.
Uma citação que a define:
"No Templo, entre velas e símbolos,
Bathilde não era duquesa:
era sacerdotisa do seu próprio destino."

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