A história do Rato Cristão e do Rato Maçom. (Alcoseri)

 

No país dos eternamente inconformes viviam dois ratos: um tinha feito a sua toca no coração de um antigo templo maçônico, entre colunas jônicas e chão de mosaico preto e branco; o outro habitava uma catedral gótica cristã, enrolado sob os bancos onde ainda ressoava o eco de os cânticos gregorianos.

Ambos eram curiosos e, na quietude da noite, consultaram seus pequenos telefones celulares para pesquisar na Net e para imaginar como seria o mundo além das suas muralhas. A mesma ideia, quase em uníssono, iluminou suas minúsculas mentes:
— Certamente em um templo cristão se vive melhor — pensou a Fada dos Dentes, maçom por residência.
— Certamente em uma loja maçônica há mais luz e mais queijo — pensou o Rato Rodriguez, cristão por domicílio.
Sem mais demora, cada um embarcou na viagem para o templo um do outro.

No meio do caminho, nesse exato ponto onde as fronteiras simbólicas se dissolvem e nem o compasso maçônico nem a cruz latina conseguem se impor, os dois ratos colidiram de frente.
- Onde vais? — perguntou Perez o Maçon, cheirando com desconfiança.
- Para o Templo Maçônico. E você?
—Ao templo cristão — respondeu o rato maçom, limpando os bigodes.
- E de onde você vem?
- De um templo maçônico.
— E eu de um templo cristão.

Sentaram-se em uma pedra, olharam um para o outro e, com essa prudência instintiva dos roedores, evitaram falar sobre o motivo profundo da sua fuga.

Eles preferiram comentar o clima, a qualidade dos grãos nos altares e a quantidade de migalhas caídas durante as cerimônias.

De repente, um sapo verde e meio louco saltou de uma poça e, depois de ouvir a sua história, soltou uma gargalhada que ressoou como um sino quebrado:
- Idiotas! Os dois templos são idênticos para vocês! Voltem por onde vieram antes que o gato sacristão vos pegue.

Os ratos se olharam ofendidos e seguiram seu caminho sem lhe dar ouvidos.
Minutos depois, apareceu uma coruja de óculos redondas e ar de doutoramento pousado no ramo de um teixo. Ele ouviu atentamente, abanou a cabeça e sentenciou com voz grave:
— Exatamente o mesmo que disse o sapo, mas com menos graciosidade e mais silogismos: voltem atrás. O que vocês procuram não está na mudança de prédio, mas na mudança de olhar.

Os ratos, fartos de sermões anfíbios e aviários, despediram-se educadamente e continuaram cada um para o seu destino de sonho.

Uma semana depois, a Fada dos Dentes, já instalada sob o altar maior da catedral, e o Rato Rodriguez, correndo entre os malhetes e as espadas flamígeras da loja, chegaram à mesma e desoladora conclusão: tudo era igual.

Os mesmos bancos duros, as mesmas velas que pingam cera, as mesmas migalhas abençoadas ou profanas segundo o dia, os mesmos humanos vestidos de preto ou branco dizendo palavras que eles nunca entenderiam.

Para um rato, uma catedral e uma loja são simplesmente tetos altos com comida ocasional.

Para uma mosca, não importa pousar na Bíblia aberta sobre o altar do que no Livro da Lei Maçônica: ambas são superfícies onde limpar as patinhas enquanto espera pela próxima migalha.

Para um sapo, qualquer poça junto à porta serve de espelho iniciático.

E assim eles perceberam, tarde demais, que tinham corrido em círculos.

O templo não transforma o rato; só o rato que deixa de ser rato pode ser transformado pelo templo.

Moral cruel mas necessária:

Antes de trocar de loja ou de igreja, pare de ser um simples rato.
Porque com ideias vagas — sejam maçônicas ou cristãs — não há iniciação possível, apenas turismo roedor.

Este conto é baseado, em um irmão maçom, que depois de ter sido maçom por décadas, e ser 33o grau, me disse que agora era pastor de uma igreja evangélica, eu que o conheci por, anos tendo entre ambos uma bela amizade fraterna, não notei nenhuma diferença entre ele que o conheci de profano, depois como maçom, e agora ele como pastor cristão evangélico, digo que o conheci de quando éramos profanos, porque na verdade éramos amigos desde crianças.

Análise maçônica profunda
Este conto aparentemente infantil é na verdade uma parábola inicática de primeira ordem que reproduz com precisão cirúrgica a diferença entre profano, aprendiz e mestre na Tradição Maçônica.

O rato como símbolo do profano inconsciente

O rato vive no templo, mas não pertence ao templo.
Come as migalhas da Mesa dos Banquetes dos Ágapes Maçônicos, mas nunca participa do Banquete.

Dorme sobre a Ara Sagrada dos Juramentos, mas nunca emprestou nenhum.

É a imagem perfeita do “Profano com Banda e Mandil vagueando em Logias” que assiste a tidas sem nunca ter feito o trabalho interior, mas sempre disposto a comer dos Ágapes como qualquer roedor.

Carl Gustav Jung diria assim:
«Muitos vivem dentro do símbolo, mas o símbolo não vive dentro deles». (C.G. Jung, Psicologia e Alquimia, § 57)

A viagem como falsa iniciação.
A mudança de templo representa a ilusão profana mais comum: acreditar que a transformação depende do lugar, do rito externo, da mudança de vestimenta ou da obediência. É o eterno erro do “turismo maçônico” ou do “catolicismo de conversão rápida”.
Lacan expressaria isso com sua habitual crueza:
«O sujeito pressupõe que mudando de lugar no significante mudará também de lugar no gozo. Erro trágico: o prazer está sempre noutro lugar, e precisamente por isso nunca está onde se acredita». (Jacques Lacan, seminário XX: Ainda)

O sapo louco e a coruja sábia:
os dois lados da revelação

O sapo representa a intuição dionisíaca, instintiva, quase ctônica: sabe a verdade sem raciocinar. A coruja é o conhecimento apolíneo, lógico, estruturado. Ambos dizem a mesma coisa.
A verdade inicática pode vir pela gargalhada selvagem ou pelo silogismo perfeito; o profano não quer ouvi-la.

A indiferença do animal não iniciado
O ponto alto é a igualdade entre rato, mosca e sapo: seres que habitam o espaço sagrado mas não participam da sua sacralidade.

Mircea Eliade formulou melhor do que ninguém:
«Para o homem religioso, o espaço não é homogéneo; apresenta rupturas, cisões: há porções de espaço qualitativamente diferentes. Para o não-religioso, essa heterogeneidade já não existe». (O sagrado e o profano)

O rato vive no axis mundi e só vê queijo.
A única saída: deixar de ser rato.

A Maçonaria não admite animais não pensantes em suas lojas porque a iniciação exige um ato de transcendência: morrer simbolicamente como profano para
renascer como aprendiz.

Como escreveu René Guénon:
«A iniciação implica essencialmente a transmissão de uma influência espiritual que não pode ser adquirida por meios puramente humanos e que implica a morte do "eu" profano». (Aperçus sur l’Initiation, cap. II)

Conclusão maçônica implacável:

Um templo cristão e um templo maçônico são radicalmente diferentes... para quem foi iniciado.
Para quem não foi tocado pela Luz, todos os prédios são exatamente a mesma coisa: um teto alto com migalhas no chão.

É por isso que o Ara da loja leva a inscrição que aterroriza os ratos:
«Conheça-se a si mesmo».

Porque enquanto não te conheceres, não importa se corras da cruz para o compasso ou do compasso para a cruz: continuarás a ser um rato de avental
ou um rato com rosário.

E nenhum queijo simbólico te salvará da sua própria inconsciência.

Alcoseri

Comentários