O processo formativo do maçom encaminha-o, desde o primeiro grau, a uma coerência entre pensamento, palavra e ação. Guia-o a alcançar afirmativamente a unidade da vida em todos os campos: uma única resposta, uma única responsabilidade, um único compromisso.
Ajusta-o a uma única tabela de valores, evitando a multiplicidade de "morais". Não há uma ética para o Templo e outra para o mercado.
O fundamento doutrinário maçônico é gnóstico, porque no homem interior habita a Verdade. Por isso a instituição Maçônica propicia a busca e realização do homem interior, em todo homem e em todos os homens.
Ortega y Grasset disse: "Eu sou eu e minha circunstância", mas também o profeta Natan disse ao Rei David: "Tu és o homem. De ti depende o destino da humanidade".
Focalizar especificamente o homem é contemplá-lo como um lento processo (produto) evolutivo de um princípio de consciência. Princípio de consciência ou “substância primordial" que se manifestou como matéria inerte na primeira etapa. Logo surgiu o fenômeno da vida, aparecendo nas formas vegetativas e instintivas do reino vegetal e animal.
No reino animal (coincidindo talvez com a linha do pensamento de Telhard de Chardin) foi ocorrendo o processo de aparecimento e formação do sistema nervoso central, culminando na configuração do cérebro humano. Cérebro este que possibilitou, ao nível da mente humana, a faculdade da reflexão e da consciência de se fazer auto-consciente.
Todo este breve relato, em síntese, é expressão do movimento natural da consciência humana rumo a uma expansão e liberdade. A experiência central do mundo moderno é a busca da liberdade.
Claramente, ao sair da Idade Média, vislumbrou-se que o homem buscou a liberdade, para dar forma ao seu próprio destino como pessoa humana. Para muitos, a procura e o encontro dessa liberdade (qualquer que seja a acepção tomada, e ainda melhor: o conjunto de todas) é um fim em si próprio. Erich Fromm, na sua clássica obra O medo da liberdade diferenciou o conceito de liberdade de e de liberdade para.
Para outros, a liberdade não é um fim em si própria: é um meio para se atingir um fim superior ou mais "transcendente".
E este fim não poderá ser outro que o da Vida. Vida plena e real, com um autêntico sentido integrado. Viver é outorgar tira sentido à existência.
Acreditemos ou não, sejamos ou não conscientes, nós, os homens, somos os únicos gestores e realizadores da História, através da nossa concepção da vida.
A dialética do porvir humano de todos os tempos aparenta surgir de duas concepções divergentes: a materialista e a idealista. Concepções que se manifestam na luta ou no defrontar do que poderíamos chamar: poder político e poder espiritual. A verdade da realidade vital contra os interesses criados. Verdades absolutas contra Verdades relativas, acomodadas. Liberdade individual contra autoritarismo limitante. Liberdade versus dogmatismo.
O primeiro intento ocidental de unir ambas as concepções, ou seja, os dois poderes, foi o dos pensadores gregos. Entre eles, Platão, no seu livro A República, tratou de espiritualizar a realidade, de onde surgiu a utopia de que os governantes deveriam ser filósofos, homens do espírito. Atenas ordena a Sócrates beber cicuta. Fracasso do espírito ante o poder político.
Mas o espírito, segundo Martin Buber, é o encontro entre o homem e o transcendente. Daí ser necessária inevitavelmente a integração. As idéias têm valor contanto e enquanto se transformem em vida palpável, concreta. Não é possível permutar a vida pelo espírito, a idéia abstrata. Nem emancipar o transcendente o espiritual, da vida cotidiana.
Espírito sem compromisso do dever é um dos sintomas da nossa atualidade, e também a sua contraparte: o materialismo desconhece a essência da vida. O material e o vital devem se fundir para que o espírito seja vida.
Responsabilidade, base da ética.
Ser significa ser totalmente. Sermos nós mesmos, assumir. É nos comprometermos com cada hora de nossos dias, é sermos um homem em plenitude. Reiteramos: viver é dar sentido à vida. Cada momento da existência põe à prova o homem. Assumirá ele a responsabilidade de responder com todo seu ser à invocação do momento? É livre. Pode escolher e decidir. Nesta eleição ele joga o sentido de sua existência. E ao eleger para si mesmo, estará elegendo para a humanidade.
A responsabilidade é a única insofismável base de toda ética.
É precisamente a responsabilidade que possibilita o exercício da ética e a pratica da moral.
O que é conflitante? O que cria a crise do homem e no homem? A cisão da existência em tabelas valorativas distintas. Pode ser que individualmente estabeleçamos a nossa própria escala de valores, nossa própria mensuração com prioridades diferentes. O importante é o ajustamento da nossa conduta à nossa tabela valorativa, evitando a multiplicidade de morais. Não há uma ética para o Templo e outra para o mercado.
Sempre há no recôndito do homem uma voz interior que o chama. que pergunta, que indaga, que reclama. Às vezes a chamamos de consciência. Perante ela, alguns fogem, se calam. Outros respondem. Alguns se ocultam entre palavras, entre idéias, entre ações. Outros revelam, se manifestam tal como são. Alguns argumentam tranqüilizando-a, se justificando. Outros se realizam se ajustam. Lutam contra a fragmentação, a divisão da vida em categorias distintas e em recintos temáticos, qual compartimentos estanques, que nenhuma relação estabelecem entre si. O ético o estético, o religioso, o metafísico, o sociológico, o econômico, o psicológico etc. que em definitivo refletem aspecto do homem, nunca do homem total.
Karl Jasper disse: "O modo como vejo a grandeza e como me comporto perante ela, me faz chegar ao meu próprio ser".
Ante um ideal de perfeição alguns expressam: são utopias; negam-no e reduzem tal ideal ao comodismo do nível em que se encontram. Outros, pelo contrário, e entre eles estão os maçons, tentam se elevar, se realizar nesta meta de perfeição. Essa meta de perfeição logicamente leva implícita a efetivação dos nossos princípios básicos.
Liberdade, igualdade, Fraternidade. Amor à Justiça; procura da verdade. Respeito à sabedoria; reconhecimento da harmonia e da justiça. Tolerância no seu legítimo limite.
Rejeição, superação ou controle da hipocrisia, ambição, inveja, egoísmo etc. Mas, acima de tudo, a pedra básica, o fundamento da nossa Instituição: a Fraternidade. E ela depende da compreensão.
Ambas, fraternidade e compreensão, determinam e descansam na responsabilidade, forjada, no nosso caso, como maçons, na real interiorização do que os nossos símbolos dinamizam.
Nossa formação maçônica implica ao menos estarmos a coberto de intenções e idéias espúrias, vigilantes de que a sabedoria, harmonizada pela beleza e pelo amor seja a potência das nossas ações, e por onde a nossa conduta esteja nas vinte e quatro horas do dia, a prumo, no transcurso do reto caminho a transitar pela vida.
Fonte: Samaúma
Ir∴ Leon Grinbery
Argentina
Traduzido da Revista Símbolo, órgão da Grande Loja da Argentina, pelo Ir∴Eduardo Escalante. Verdade mai/jun 1996
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