UM POUCO DA HISTÓRIA ISLÂMICA

 


Um dos personagens mais importantes e menos conhecidos da história do Islã é al-Malik al-Zahir Rukn al-Din Baybars al-Bunduqdari, ou, mais conhecido como Baybars.

Ele viveu em um dos períodos mais turbulentos da história, quando mongóis e cruzados se uniram com um objetivo único: extirpar o Islã da face da terra.
A constante permanência dos cruzados e seus reinos em território muçulmanos mostrava que o cavalheirismo e diplomacia de homens como Saladino não eram o suficiente para expulsar ou conter os cristãos europeus e seus exércitos das terras do Islã.

Tratados de paz eram quebrados, massacres ocorriam ocasionalmente e a população da região não podia mais suportar a presença cruzada. E deixando pior a situação dos muçulmanos, um novo inimigo vindo das estepes asiáticas devastava cidade após cidade com seus enormes exércitos, os mongóis. Para se ter uma ideia de como critica era a ameaça mongol, é necessário saber que quando invadiram Bagdá em 1258 liderados por Hulago Khan, os mongóis mataram por volta de 200.000 muçulmanos. E após executarem o califa Al-Musta'sim e sua família, o líder mongol ordenou a construção de uma igreja onde era o palácio do califa.
Era preciso alguém tão implacável quanto os cruzados para lidar com ambos os invasores.

Era preciso Baybars.
Nosso herói nasceu em 19 julho de 1223 na Cumânia entre os rios Volga e Don na tribo nômade dos Kipchaks. Ele era de pele branca, cabelos castanhos, alto e tinha uma curiosa marca em um de seus olhos azuis.
A vida nômade era repleta de dificuldades e era prática comum a venda de garotos para o trabalho militar nos estados muçulmanos medievais, especialmente no Egito. Porém, eles poderiam até ascender a posições de riqueza e poder, visto que sua condição de escravos não era permanente. Esses garotos, após exímio treinamento, passavam a ser chamados de Mameluco, que significa ''possuído''.

Comprado pelo emir egípcio Aydekin El-Bunduqdar, após ter sido trazido de Sivas no Sultanato de Rum para Alepo na Síria, foi escolhido pela sua alta estatura e inteligência notável. O garoto de olhos azuis recebeu então o nome de Rukn Ad-Din Baybars Bunduqdari. Integrado no exército de escravos mamelucos, do Império Aiúbida, demonstrou logo cedo todas as suas potencialidades de guerreiro.

Mais tarde, devido à sua coragem em combate, acaba por ser presenteado com uma nomeação para o posto de emir (general) do sultão Saleh Ayyub. Após um golpe mameluco para a remoção de Saleh, o general Qutz ascendeu ao trono, e em seguida após seu assassinato, foi sucedido por Baybars.
Sua carreira militar foi excepcional. Somente durante seus 17 anos de sultanato (1260–1277), ele realizou 38 campanhas, chegando a percorrer 40 mil quilômetros. Lutou 9 vezes contra os mongóis, 5 contra os armênios e 3 contra os nizaridas ou "assassinos". Contra os cruzados lutou em 21 ocasiões, saindo vencedor em todas. Alcançou conquistas consideradas impossíveis, como os castelos do mar da Galileia, em 1266, Beaufort dos Templários (às margens do rio Litani, no sul do Líbano), em 1268, e a famosa Kerak dos Cavaleiros (a oeste da cidade de Homs, na Síria), em 1271. Além disso, conquistou as cidades de Arsuf, Cesaréia, Jaffa, Haifa, Toron e Antioquia. Em 1273 destruiu o castelo dos Assassinos, em Masyaf (perto de Hamah, na Síria), onde vivia Sinan, conhecido como o "Velho da Montanha" e sua sinistra organização. Sem falar de sua participação da épica batalha de Ain Jalut, onde os mongóis sofreram sua primeira derrota por mãos muçulmanas.
Por vezes o líder mameluco da nova dinastia Bahri recorria a decapitações e empalação de cabeças dos cruzados derrotados e venda dos conquistados como escravos para assustar o inimigo, como fez após a conquista da fortaleza de Safed, deixando claro que não ia mais tolerar os cruzados.

Entretanto, Baybars se comprometeu a não tomar completamente os últimos territórios cruzados que não pertenciam ao seu domínio tais como Acre e Trípoli, em troca de rotas comerciais, mais favoráveis. De fato, o grande sultão teria percebido que com o estabelecimento dos ocidentais no oriente, o comércio se tinha incrementado a níveis nunca antes vistos, uma vez que os cristãos abriram as portas a muitas oportunidades de negócio com o Ocidente.
Depois que o califado abássida no Iraque foi derrubado pelos mongóis em 1258, quando conquistaram e saquearam Bagdá, o mundo muçulmano carecia de um califa, um líder teoricamente supremo que às vezes usava seu ofício para dar legitimidade aos governantes muçulmanos distantes.

Assim, quando o refugiado abássida Abu al-Qasim Ahmad, o tio do último califa abássida al-Musta'im, chegou ao Cairo em 1261, Baybars mandou proclama-lo califa como al-Mustansir II e devidamente recebeu investidura como sultão dele.

Infelizmente, al-Mustansir II foi morto pelos mongóis durante uma expedição mal-aconselhada para recapturar Bagdá no mesmo ano. Em 1262, outro abássida, supostamente o tataraneto do califa al-Mustarshid, Abu al-Abbas Ahmad, que sobrevivera da expedição derrotada, foi proclamado califa como al-Hakim I, inaugurando a linhagem de califas abássidas no Caior, que continuaram a legitimar o sultanato mameluco, até 1517.

Como seu antecessor infeliz, al-Hakim I também recebeu o juramento formal de aliança de Baybars e lhe deu legitimação. Enquanto a maioria do mundo muçulmano não levava esses califas a sério, pois eram meros instrumentos dos sultões mamelucos, eles ainda davam certa legitimação e também um elemento decorativo ao seu governo.
Durante seu reinado, além das guerras intermináveis, Baybars também se destacou como reformador religioso e estadista. Proibiu a prostituição e bebidas alcoólicas, que eram punidas com a pena de morte. Nos acampamentos ou nos palácios do Cairo, ou de Damasco, denunciava com sua voz potente e imperturbável os males da época e recomendava soluções adequadas. Mandou construir escolas, mesquitas, hospitais, um estádio olímpico, balsas e canais no vale do Nilo, cozinhas populares, distribuição anual de 10.000 bolsas de cereais para assistência social aos pobres e implementou um serviço postal que levava 4 dias do Cairo até Damasco.

Seus domínios eram vastos, e abrangiam toda a Síria e Egito. Sob seu patronato, surgiram figuras como o grande médico árabe Ibn al-Nafis. Baybars também ordenou a construção de um jardim de gatos no Cairo, fornecendo comida e abrigo aos animais.
Baybars também desempenhou um papel importante em trazer os mongóis ao Islã. Ele desenvolveu fortes laços com os mongóis da Horda Dourada e tomou medidas para que viajassem ao Egito após o fim dos conflitos. Muitos mongóis acabaram por abraçar a religião islâmica neste período.
Ele morreu de maneira ainda discutida pelos historiadores em 1 de julho de 1277 aos 54 anos em Damasco.

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