O CÉREBRO e a LOJA MAÇÓNICA, uma metáfora…

 

cérebro

“La ignorancia es la noche de la mente, pero una noche sin luna ni estrellas”

Confúcio

É um bom desafio metaforizar o funcionamento de uma loja maçónica comparando-a ao cérebro. Talvez mesmo, devesse questionar se esta comparação não seria melhor descrita como  uma “digressão cognitiva fantasiosa”.

Este desafio foi implantado no meu cérebro pelo Venerável Mestre Cláudio João Bucco, que por honra e agradecimento cito como co-autor. Infelizmente, contingências profanas afastaram-no do nosso convívio em Loja. Mas como dizia Martin Luther King Jr.,

A verdadeira medida de um homem não se vê na forma como se comporta em momentos de conforto e conveniência, mas em como se mantém em tempos de controvérsia e desafio”.

Então, mãos à obra!

Ao considerar a disposição ou planta de um Templo Maçónico, surge a primeira analogia que poderia ser chamada de: “ANATÓMICA”.

O Oriente (Or), parte anterior do Cérebro ou Lobo Frontal, é onde se postam o Venerável MestreOradorSecretário e autoridades.

As Colunas do Norte e do Sul, representadas nos hemisférios cerebrais, é onde se localizam os Lobos Parietais e Temporais, local onde se assentam os demais obreiros. É possível afirmar que os Vigilantes estariam ‘sentados’ sobre o Cerebelo, órgão relacionado à coordenação.

Guarda do Templo e Expertos, funções de alta relevância nas Iniciações, postados na parte mais ocidental da Loja, por poderem ver todo o seu funcionamento, seriam, pois, a sua visão, que no Cérebro é localizada no Lobo Occipital (Oc).

Cérebro é como o músculo de um desportista. Se não se exercita com constância, perde rapidamente a forma; quanto mais dele exigimos mais nos dará e quanto mais se exercite, mais forte, mais potente e ativo estará.

É o papel que se espera dos Obreiros de uma Loja Maçónica, independentemente de grau

À medida que o Obreiro se afasta dos trabalhos da Loja, cada vez mais perde a interacção, a vontade e a capacidade de discernir as vantagens de ali permanecer; quanto mais ausente, mais questionamentos fará. Pertencer a uma Instituição secular como a Ordem Maçónica implica em adquirir conhecimentos e cultivar o prazer de convivência com um mosaico de pessoas.

Conhecimento e amizade, factores que, seguramente, contribuem enormemente para a densificação e ampliação da nossa rede neuronal, assim como, da nossa reserva cognitiva, fazendo com que o passar dos anos não seja um factor tão determinante no declínio das nossas capacidades mentais.

Aqui poderíamos criar uma analogia que diríamos ser “SOMATÓRIA”.

Em toda actividade humana, o trabalho isolado pode produzir resultados, por vezes brilhantes, contudo, se formos observar as grandes conquistas sócio-tecnológicas obtidas pela humanidade, veremos que, somente o trabalho de equipe, as aperfeiçoou.

O que aconteceria se utilizássemos o exemplo do nosso cérebro e buscássemos facilitar-nos mutuamente no lugar de criticarmos, de acharmos que somente nós sabemos fazer melhor, de buscarmos justificativas para simplesmente não fazermos ou nas asas da procrastinação transferirmos para depois o que deve ser feito hoje ou, por fim, utilizarmos com certa frequência o princípio da “Ignorância Pluralística” de Allport (Floyd Henry Allport, 1924 – Se o outro não faz, por que vou fazer?)?

Juntos, sempre poderemos fazer o máximo; sozinhos, apenas o factível!

Em cada Loja, um grupo de seres humanos, quase sempre líderes nas suas actividades, fazendo uso de uma máquina divina e brilhante, fervente de ideias, conceitos, vontades, dúvidas e frustrações; uma plêiade de cérebros reunidos, cada um com um pensamento diferente: de concordância ou discordância; de aprovação ou desaprovação; de satisfação ou insatisfação; quase sempre de ‘faria igual’, ‘diferente’ ou mesmo ‘melhor’. 

É como o Pavimento Mosaico, representando os contrastes extremos…

Imaginemos, pois, se as funções destes milhares de neurónios individuais, se somassem em cada grupo de obreiros, configurando uma rede de cerca de muitos milhões de neurónios voltada a metas e finalidades comuns.

Seria como alguém disse, uma “utopia viável”?

Ou continuaremos com o que vemos na maioria das vezes: apenas uma discordância gratuita, surda e absurda?

O nosso cérebro é extremamente optimizado. Ele evita fazer duas vezes o mesmo trabalho. Um adulto médio, diz-se, pode ter entre 40 e 60 mil pensamentos por dia. Qualquer um de nós ficaria insano se o cérebro tivesse que processar conscientemente tal quantidade. Por isso, a maior parte destes pensamentos é automatizada e não aparece no índice de eventos do dia. Para que as coisas não saiam do controle, o cérebro faz parecer que nós não vimos, não sentimos e não vivenciamos aqueles pensamentos automáticos, repetidos, iguais.

Por isso, quando vivemos uma experiência pela primeira vez, ele dedica muitos recursos para compreender o que está acontecendo. É quando nos sentimos mais vivos. Conforme a mesma experiência se vai repetindo, ele vai simplesmente colocando as suas reacções no modo automático e “apagando” as experiências duplicadas (adaptado de “A Percepção do Tempo pelo Cérebro” de Aldo Novak).

A analogia aqui é “INICIÁTICA”. Por um lado, a constatação de que ao sermos iniciados na Maçonaria, todo o nosso cérebro se volta para o novo, para o inesperado. A nossa atenção busca os detalhes, as emoções do momento. Por outro, o risco quase sempre presente da automatização dos processos, com a perda do entusiasmo, do interesse, do encanto.

De quem é a responsabilidade de manter este cérebro sempre em busca do novo? Somente do indivíduo? Ou da Instituição, seja no sentido global ou de uma Loja em particular?

O que vemos comumente é a atribuição da motivação aos próprios iniciados e talvez, por isto, tantas desistências!

O nosso cérebro é responsável por todas as nossas capacidades  emotivas. 

Amorpaciência, percepção e tolerância são as que mais nos são cobradas nas nossas instruções e discussões.

Mas outras estão espalhadas e actuam de forma quase sempre incontrolável: insegurança, o medo e a dor

Como seria fácil se conseguíssemos perceber e sentir quais sentimentos e preocupações afligem a nosso Irmão naquela reunião específica.

Por vezes, contrapomos enfaticamente ideias sem, ao menos, dar-nos o trabalho de tentarmos perceber o que se passa naquele cérebro irmão. Que sentimento curte ele no exacto momento de uma intervenção qualquer? Não estará pedindo ajuda?

Entendamos isto e teremos a harmonia como instrumento emocional da verdadeira Iniciação

Continuando a nossa digressão, fantasiamos outra analogia, a “EXECUTIVA”. 

Venerável Mestre foi colocado sobre o Lobo Frontal, não só para representar a distribuição dos cargos em Loja, mas sim, porque são estas áreas do córtex que organizam o comportamento, desde a elaboração de metas e estratégias, passando pela representação de valores e tomada de decisões, incluindo julgamentos morais, até o comando dos movimentos propriamente ditos.

A principal função desta área do cérebro é similar àquela que deve ser exercida pela Luz máxima da Loja, ou seja: o planeamento e análise das consequências de ações atuais e futuras, recebendo informação de ambos os hemisférios. É como deve funcionar uma Loja Maçónica, com o Venerável Mestre recebendo e processando as informações vindas do ocidente e do Oriente, da Coluna do Sul e do Norte, do mais novo Aprendiz ao mais antigo Mestre Instalado e nelas se baseando para adoptar as melhores decisões para todo o grupo.

A Razão Humana depende de vários sistemas cerebrais que funcionam de forma coordenada, ou seja, várias regiões cerebrais cooperando umas com as outras nas tomadas de decisões e, por extensão, na adequação do comportamento social e da capacidade criadora. 

A resolução de problemas realiza-se, pois, através do planeamento, sendo requisição básica a existência de uma lista de objectivos e um conjunto de acções estruturadas para atingi-los.

As chamadas Funções Executivas envolvem a formulação destes objetivos, com antecipação, planeamento, monitoração e desempenho efetivo.

Seria ou não esta, a principal função de um Venerável?

lobo parietal fica imediatamente posterior ao sulco central, que é a dobra mais profunda do córtex, processando todos os sinais relacionados ao espaço corporal, determinando inclusive a qual parte desse espaço dedicamos a nossa atenção; aí, estaríamos correlacionando de um lado com os Aprendizes e do outro, com os Companheiros. 

No caminho teórico da busca da perfeição, ambos têm mais presença corporal do que espiritual; as suas presenças são fundamentais para o funcionamento da Loja e para a medida exacta da acção dos verdadeiros Mestres Maçons.

Que seria de uma Loja sem Aprendizes? Que seria de uma Loja sem Companheiros? Que seria dos Mestres sem as suas presenças? 

Desde o seu espaço eles observam, aprendem e até, já podem ensinar pelas suas posturas e atitudes. É a reciprocidade entre o todo e as partes; uma não vive sem a outra!

O lobo temporal destaca-se na lateral do cérebro, abaixo de outra grande dobra (o sulco lateral), e processa informações auditivas, visuais, e ainda participa da representação da identidade pessoal (o “self”) e do julgamento moral; os sons são percebidos quando a área auditiva primária é estimulada, porém, é uma área de associação, a área auditiva secundária, quem recebe os dados e em interacção com outras zonas do cérebro, lhes atribui um significado permitindo ao ser humano reconhecer o que ouve.

Aprendiz mais ouve do que fala; mais interage pela audição do que pela fala. É o silêncio maçónico que sabiamente ensina a aprender ouvindo e assim, permite melhores julgamentos; a fala por vezes prejudica o raciocínio, faz predominar a emoção, embota a razão.

Os ensinamentos maçónicos são como o funcionamento do lobo temporal: conheça-te primeiro, para só então, conheceres e julgares os demais; é a introspecção; é o aperfeiçoamento do “self” ou do “si mesmo”; é a câmara individual de reflexão

Quando evolui na maturidade, o Companheiro e posteriormente, o Mestre, finalmente começam a entender todo o significado da simbologia maçónica, podendo assim, utilizar a capacidade do cérebro para realmente escutar o que tem que ser ouvido e saber entender o que está falando.

No caminho do Oriente para o Ocidente, do meio-dia à meia-noite, tempo de trabalho dos maçons, se espalha a luz, a luz da sabedoria; é a visão do trabalho maçónico; do lobo frontal nas regiões anteriores do cérebro (Oriente), em direcção ao lobo occipital (Ocidente), o mais posterior e responsável pela visão; a área visual comunica-se com outras áreas do cérebro que dão significado ao que vemos tendo em conta a nossa experiência passada, as nossas expectativas. 

Por isso é que o mesmo objeto não é percebido da mesma forma por diferentes pessoas.

A visão é um sentido dominante, usando muito dos recursos cerebrais; assim sendo, vemos apenas o que o cérebro nos diz para ver e isto está longe de ser exacto.

Embora possamos ter outras facilidades, o melhor modo de aprender e recordar é por meio de figuras e não por palavras escritas ou faladas (“Aumente o Poder do seu Cérebro”, John Medina; GMT Editores Ltda., RJ/RJ). É assim com o simbolismo maçónico: vemos com os nossos olhos, interpretamos com a nossa experiência e conhecimento.

cerebelo ajuda a manter o equilíbrio e a postura. É uma zona dorsal e desempenha um papel importante na manutenção da coordenação da atividade motora. Esta região recebe ordens do cérebro sobre os músculos e “ajusta-as” para uma melhor atuação motora. 

Na Loja, na sua região mais ocidental, localizam-se o Guarda do Templo e o Cobridor Externo. Quando recebemos a incumbência de exercermos uma destas funções, é comum ouvir um certo farfalhar de decepção e perceber certa insatisfação, como se secundárias fossem. São, contudo, funções vitais numa Loja Maçónica e a exemplo do cerebelo, proporcionam equilíbrio e segurança às sessões, mantendo a sua discrição e fazendo a selecção de quem adentra ao templo.

O cérebro tem conexões específicas; o que fazemos e aprendemos modifica a sua aparência física e funcional, ou seja, literalmente o reprograma com novas conexões (“Aumente o Poder do seu Cérebro”, John Medina. GMT Editores Ltda, RJ/RJ). 

É também conhecido que as diversas áreas cerebrais se desenvolvem em diferentes velocidades em cada pessoa e que não existem dois indivíduos cujos cérebros armazenem a mesma informação da mesma maneira e no mesmo lugar. Por isto, temos diversos tipos de inteligência.

Temos então, a última analogia, a da “MULTIFUNCIONALIDADE”. 

Uma Loja Maçónica é multifuncional. São funções ritualísticas que determinam o conjunto da sessão maçónica e cada uma delas exercida de forma diferente por Irmãos diferentes. Insere-se aqui o conceito de inteligências múltiplas (“Inteligências Múltiplas: A Teoria na Prática”, Howard Gardner. Editora Artes Médicas, 1995).

Temos que buscar entender as várias maneiras como pode funcionar cada um dos integrantes da Loja. Temos que entender a inteligência como uma capacidade inata, geral e única, que permite aos indivíduos um desempenho, maior ou menor, em qualquer área de atuação. 

A principal contribuição é mostrar que todos os indivíduos são inteligentes, porém, de forma diferente e que as suas inteligências são reforçadas, desenvolvidas ou não dependendo dos estímulos que recebem do ambiente/cultura que o cercam.

Entre as várias formas de inteligências mais estudadas estão:

  1. A Inteligência linguística: habilidade para lidar com palavras de maneira criativa e de se expressar de maneira clara e objectiva. Função atribuível ao Orador e Secretário.
  2. A Inteligência lógico-matemática:capacidade de analisar problemas, operações matemáticas e questões científicas. Função atribuível ao Tesoureiro e Chanceler.
  3. A Inteligência espacialcapacidade de reproduzir, de organizar elementos visuais de forma harmónica; de se situar e se localizar no espaço. Função atribuível ao Mestre de Cerimónias.
  4. A Inteligência musicalpermite organizar elementos sonoros de forma criativa e independe de aprendizagem formal. É o nosso Mestre de Harmonia.
  5. A Inteligência corporal cinestésica: capacidade de utilizar o próprio corpo para expressar ideias e sentimentos. Relacionaremos aqui com a ritualística imponente dos Vigilantes com as suas imposições de voz e gestos.
  6. A Inteligência interpessoalcapacidade de compreender outras pessoas: o que as motiva, como elas trabalham, como operar cooperativamente com elas. Aqui, podemos afirmar, é a característica fundamental exigida a um Venerável Mestre.
  7. A Inteligência intrapessoal:é uma capacidade correlativa voltada para dentro de si mesmo. É a capacidade de formar um modelo acurado e verídico de si mesmo e de utilizar esse modelo para operar efectivamente na vida. Diria ser a grande característica que necessita ser ensinada pela Instituição a cada um dos seus membros.

Cabe, pois, à Instituição, o verdadeiro papel de Escola. 

Escola é Conhecimento e conhecimento é a base em que se alicerça a Maçonaria (Do Meio-Dia à Meia-Noite, João Ivo Girardi. Nova Letra Gráfica e Editora Ltda. Blumenau/SC). A escola maçónica tem um objetivo e este está no objeto e o objeto é o ser humano.

Qual a capacidade de realização de uma Loja Maçónica? 

Há um conceito arraigado na mente de muitos e utilizado por outros tantos aproveitadores da boa fé que só utilizamos 10% da nossa capacidade cerebral. Será que também só utilizamos 10% da capacidade de realização das nossas Lojas?

Aqui é bem possível, lá apenas um mito, como é comum dizer, uma baita lenda urbana.

A forma de entendermos o funcionamento cerebral é imaginarmos a “World Wide Web” (ou “www”). Imaginem a analogia de um computador “plugado” na rede internet e um neurónio, infinitamente mais complexo, ligado numa rede extremamente mais sofisticada, a rede neural. O cérebro está constantemente funcionando 100%!

Mas em ambos os casos, a produtividade é dada pelo conjunto, ao contrário das nossas Lojas e da própria Instituição; é o retorno da analogia “SOMATÓRIA”!

É novamente a parte constituindo o todo. Quanto individualmente se está contribuindo para este todo? No caso, aos próprios Irmãos, à Loja, à Instituição ou mesmo à sociedade? Fazemos o máximo ou o mínimo? Que cada um faça a sua própria meditação!

Ao executar uma tarefa, o cérebro utiliza quantas das suas partes sejam necessárias para a sua adequada realização; não trabalha em percentagem e sim, o faz, sem se importar biologicamente com vaidades, ou seja, com uma área “achando ser” melhor que a outra; uma área altamente especializada num determinado aspecto funcional soma-se à outra área superespecializada em outro para obter o melhor resultado possível.

Fazemos isto? Ou olhamos apenas com olhar crítico aquilo que nunca havíamos pensado, contudo, sempre achando que poderíamos fazer melhor? O cérebro ensina esta lição; cabe-nos querer aprender ou não!

Precisamos, finalmente, compreender que o cérebro é multifuncional e interdependente; precisamos estudar para entender a multifuncionalidade de uma Loja Maçónica e a interdependência de cada um dos seus obreiros. 

Precisamos entender que aqui, ninguém é mais sábio que o outro, mas que sim, temos capacidades diferentes e que se soubermos somá-las ou multiplicá-las, teremos um resultado esplendoroso. 

Mas como sói acontecer mais frequentemente, quando diminuímos ou dividimos, o resultado termina desastroso.

No mundo atual, não somos na essência operativos; somos na essência, especulativos. Se quisermos manter o nosso cérebro saudável e a nossa Instituição operante, estudar, estudar e estudar deve ser, então, a nossa principal missão.

Mas lembremos: uma pitada de Operativo, sempre é muito motivador!

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