As Moradas da Alma

 


Há em cada ser um labirinto secreto, tecido com os fios invisíveis da memória, do desejo e da dor, onde a alma constrói suas moradas.

Diferente das casas que habitamos com o corpo, essas não possuem paredes de concreto, nem telhados que nos protejam da chuva.


São feitas de silêncios acumulados, gestos não ditos, palavras que ecoaram sem resposta, e olhares que atravessaram o tempo.

As moradas da alma são lugares onde nos refugiamos, não para escapar do mundo, mas para compreendê-lo em sua dimensão mais íntima e intransmissível.

Algumas dessas moradas são vastas como desertos, com dunas de saudade que o vento da lembrança redesenha a cada passo.

Outras são pequenas como o coração de um pássaro, pulsando de esperança em cada batida. Há aquelas construídas sobre ruínas, onde o lamento é o alicerce, e a reconstrução, uma promessa que ainda resiste.

E existem também moradas suspensas no tempo, onde os instantes felizes permaneceram intactos, como relicários, lembranças que a alma visita em segredo, como quem retorna a uma capela abandonada para acender uma vela ao passado.

A alma é nômade por natureza, mas há lugares onde ela finca raízes invisíveis. São os afetos verdadeiros, os vínculos que transcendem a carne e que, mesmo dissolvidos na ausência, continuam habitando o âmago.

Nesses lugares, mora o que fomos, e o que jamais deixamos de ser. O cheiro de um livro antigo, o som de uma risada que o tempo levou, a ternura de um abraço que ainda nos protege, mesmo em sua ausência, tudo isso é arquitetura sutil do espírito.

Mas nem todas as moradas
da alma são belas.

Algumas são cavernas sombrias, onde habitam nossos medos, nossas sombras mais densas, nossas vergonhas mais secretas. Entrar nelas é um ato de coragem, pois só quem se atreve a adentrar os próprios abismos descobre, ao final do túnel, a chama tênue da autenticidade.

A luz da alma, quando emerge, é sempre fruto de um pacto com as trevas.
As moradas da alma não obedecem à lógica do espaço, nem do tempo. Elas coexistem, se entrelaçam, se contradizem.

Em uma só vida, podemos ser inquilinos de muitas almas que nos atravessam. Somos, ao mesmo tempo, lar e exílio, acolhimento e desterro.

E talvez a maior tarefa da existência seja aprender a habitar a si mesmo, sem medo, fazer da alma, não um esconderijo, mas um templo.
No fim, as verdadeiras moradas da alma não se constroem com as mãos, mas com os olhos que veem além da superfície, com o coração que escuta os silêncios, com a coragem de quem transforma a ferida em janela.

São lugares que não podem ser
tomados, comprados ou perdidos,
porque a alma, essa errante eterna,
leva consigo cada casa onde
amou, sofreu ou compreendeu.

E quando partimos deste mundo, não levamos malas, apenas essas moradas, invisíveis, sagradas, eternamente nossas.


Oliver Harden

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